sábado, 21 de setembro de 2024

Por que o Instagram estraga as moças católicas?

No artigo "Conservadores católicos se rendem à imodéstia", buscamos traçar um paralelo entre duas fases do catolicismo conservador no Brasil antes e depois da pandemia da COVID-19. Identificamos que o catolicismo brasileiro sofreu uma mudança significativa, entre elas o crescimento do que aqui chamamos de Feminismo Católico, tema corriqueiro em nosso blog.

O feminismo que aqui denominamos trata-se de um movimento cada vez mais crescente entre as católicas conservadoras que mina a doutrina da Igreja a respeito da hierarquia familiar, o trabalho da mulher, os filhos como fim primário do matrimônio e a modéstia no vestir. Não se trata de um feminismo explícito como o feminismo mundano, mas daquele tipicamente forjado pelo catolicismo liberal, isto é, que, aparamente, não rompe com a doutrina, porém a torna uma ideia que o católico pode facilmente relativizar ou dispor. Nas palavras do Pe. Augustin Roussel em sua obra "Liberalismo e Catolicismo":

"O "católico liberal"" separa o fim dos meios, a teoria da prática; pior ainda, ele os opõe até torná-los incompatíveis. Para ele, a "tese" é o "ideal" impossível, o absoluto quimérico, o abstrato irreal; a "hipótese" é o "possível", o concreto, o real. Tem ele a mania de certas oposições fantasiosas: do mesmo modo que contrapõe autoridade e liberdade, pretende de bom grado que os partidários da "tese" sejam incapazes de se dobrar à "hipotese", que os especulativos não possam ser práticos, não têm senso das realidades, que a intransigência doutrinal não poderia se aliar à prudência realizadora." (p. 114-115)

Esta mentalidade é corriqueiramente vista quando o tema é a modéstia. Moças raivosas porque não conseguem achar outra solução prática para a academia a não ser o uso de leggings. Ou ainda, moças que dizem que usar apenas saia ou vestido é necessariamente voltar a uma moda caricata do século XIX.

Pois bem, mas por que o feminismo cresceu tanto entre as católicas conservadoras?

Tendo como referência o período que o catolicismo conservador começou a migrar do conservador tradicional (2010-2019) para o conservador liberal, temos um esboço de resposta para o fenômeno: o Instagram.

Caraterísticas gerais do Instagram

Diversas pesquisas indicam que o uso do Instagram aumentou exponencialmente após o início da pandemia do coronavírus, o que coincide com a "virada de chave" das conservadoras católicas, que a partir de então tornaram-se progressivamente mais feministas.

Mas por que o Instagram teria provocado o fenômeno e não o Facebook, Twitter (X) e outras redes sociais? Para responder essa pergunta é necessário compreender as principais características do Instagram. Citemos algumas:

1) Ao contrário do Facebook e do Twitter, redes sociais focadas no texto, o Instagram é focado na imagem. Não apenas no compartilhamento de fotos, mas na divulgação de uma estilo de vida.

2) No Facebook, há possibilidade de criação de perfis, páginas e grupos (privados e públicos). No Instagram, somente há a possibilidade de criar perfis.

3) O Instagram é a principal ferramenta de divulgação de negócios onlines. Nele, não se "adiciona amigos", mas se "segue autoridades" de diversos ramos.

O Instagram, portanto, é uma rede social "narcisista", onde a pessoa vende a si mesma e seu estilo de vida para os outros. Por isso, ela é a rede social perfeita para a construção de autoridade em qualquer ramo.

Perigo para as mulheres

Diversos estudos apontam que o uso do Instagram tem sido a causa de depressão e ansiedade atingindo, em especial, as mulheres. Neste artigo da Joint Economic Commitee Republicans do Senado americano intitulado "Is Instagram Causing Poorer Mental Health Among Teen Girls?", nota-se que a depressão em jovens americanas é simplesmente descomunal quando comparada com os jovens do sexo masculino:


Segundo o artigo "Here’s How Instagram Harms Young Women According To Research" divulgado pela Forbes, o Instagram tem causado problemas, principalmente, com a autoestima da mulher.

A razão nos parece manifesta. As mulheres não buscam o Instagram como uma rede social normal, mas para encontrarem verdadeiros oráculos para guiarem suas vidas. Ademais, como esta rede social é voltada para a divulgação da imagem e de estilos de vida, a mulher tende a se comparar mais com outras que crê serem mais bem sucedidas, o que, muitas vezes, acaba afetando sua autoestima.

Perigo para as mulheres católicas

Contudo, apesar dos perigos psicológicos serem evidentes, reputamos que o maior perigo do Instagram seja de alimentar as piores tendências e tentações do sexo feminino. Citemos algumas:

1) Vaidade. O Instagram valoriza a divulgação da imagem da pessoa. Para as mulheres isso é tentador. Postar selfies todos os dias, fotos na academia, ganhar likes, interações, compartilhamentos, são típicos comportamentos da mulher que usa Instagram, atitudes estas que só tem por finalidade acalentar a estima pessoal.

A autoexposição desordenada, no entanto, é um dos principais obstáculos para se obter a virtude da modéstia. Não é à toa que o aumento do uso do Instagram pelas mulheres também coincidiu com a onda de moças católicas questionando padrões de modéstia que antes não duvidavam. Não se deve assim subestimar esta rede social neste ponto. Ela tem realmente o poder de mudar a psicologia da mulher na percepção de si mesma e alterar seu padrão de compartamento.

Se antes ela se contentava em vestir-se de modo feminino usando vestidos e praticando a devoção do véu, agora ela já odeia essas coisas e precisa se adequar às massas ou à moda para conseguir mais likes.

2) Masculinização. Como dissemos acima, o Instagram incentiva a construção de "autoridades". A rede social valoriza a autopromoção. No Facebook, a construção de autoridade é mais difícil, tendo em vista que há maiores mecanismos para o perfil ser contestado em suas ideias. No Instagram, não. A pessoa abre uma "caixinha de perguntas" e "doutrina" seus seguidores. Contudo, como pontuamos no artigo "Paul Fahey, feministo do "Where Peter Is", fala groselha sobre Efésios 5", não é adequado para as mulheres assumirem papéis de "doutrinadoras", "autoridades" ou de "guia das massas". O Instagram cria uma falsa sensação para as mulheres de que a sua posição no mundo é a de guiar massas de pessoas adultas. Em outras palavras, o Instagram masculiza as mulheres na medida que lhes incute  o sentimento de que devem ser líderes ensinando como a vida das pessoas deve ser.

Neste sentido, dizia São João Crisóstomo em seus "Comentários às Cartas de São Paulo":

"Não ensinem, mas coloquem-se na posição de discípulos; demonstrem submissão através do silêncio. O sexo feminino é um tanto loquaz e por isso Paulo sempre o reprime. “Porque primeiro foi formado Adão, depois Eva. E não foi Adão que foi seduzido, mas a mulher que, seduzida, caiu em transgressão.” Importa às mulheres de nosso tempo? Sim, assegura. O gênero masculino alcançou honra maior. O homem foi plasmado primeiro. Em outro lugar trata da primazia, dizendo: “O homem não foi criado para a mulher, mas a mulher para o homem” (1Cor 11,9). Por que o assevera? A fim de atribuir ao homem múltipla prevalência. Em primeiro lugar porque tem a primazia no tempo; segundo, pelos acontecimentos. Ela ensinou uma vez ao homem, tudo subverteu e tornou-o culpado de desobediência. Deus a submeteu, porque empregou mal o domínio, ou antes a igualdade.“Teu desejo te levará ao teu marido” (Gn 3,16). Anteriormente não fora dito. Adão não foi seduzido? Não teria desobedecido se não tivesse sido seduzido? Atenção! “E a mulher respondeu: a serpente me seduziu” (Gn 3,13). Adão não disse: A mulher me seduziu, mas: “A mulher me deu, e eu comi”. Não é o mesmo ser enganado por uma companheira, uma parente ou por um animal, um servo, submisso ao homem, o que constitui verdadeira sedução. Em comparação, portanto, com a mulher afirma-se que ele não foi seduzido, porque ela fora enganada por um súdito e subordinado e ele por uma mulher livre. Ainda relativamente a Adão não foi dito: “Viu que a árvore era boa ao apetite” (Gn 3,6), mas a respeito da mulher diz-se que comeu e deu ao marido. Por conseguinte, ele não prevaricou, vencido pela concupiscência, mas simplesmente obedeceu à mulher."

Em outras palavras, o Pecado Original entrou no mundo porque Eva liderou Adão.

Santo Tomás, na Suma Teológica, acrescenta que, em regra, mulheres não possuem sabedoria eminente para ensinar em público:

Dois usos pode ter a palavra. – Um privado, quando falamos familiarmente a um ou a poucos. E, então, as mulheres podem receber a graça da palavra. – Outro público, quando a palavra é dirigida a toda a Igreja. E isto não é permitido à mulher.

Primeiro e principalmente, pela condição do seu sexo, que a torna sujeita ao homem, como se lê na Escritura. Ora, ensinar e persuadir publicamente, na Igreja, não pertence aos súditos, mas aos superiores. Contudo, mais que a mulher, os homens dependentes de um superior o podem por delegação; porque a sujeição deles ao superior não se funda naturalmente no sexo, como se dá com as mulheres, mas nalgum acidente sobreveniente. – Segundo, para que não se desperte a concupiscência do homem, pois, diz a Escritura: A sua conversação se ateia como fogo. – Terceiro, porque geralmente as mulheres não têm sabedoria perfeita a ponto de convenientemente se lhes poder cometer o ensino em público. (S. Th. II-IIae, q. 177, a. 2, sol.)

Os ouvidos modernos nessas horas gritam de raiva, ódio e uma eventual leitora pode se indignar contra os Doutores da Igreja. Contudo, o que todos os Doutores querem simplesmente dizer é que a mulher possui uma inteligência mais emocional e por isso a arte da persuasão pública não lhes convém ou, em regra, induzirá as pessoas a muitos erros. Ter uma inteligência mais emocional, no entanto, não é um defeito. Como afirma o Pe. Chad Ripperger no vídeo "Feminism and Natural Order":


"Na Queda, Satanás foi atrás de Eva, porque as mulheres estão mais ordenadas à vida emocional. Isso não é uma desordem em si. [...] O que isso significa é que mulheres estão mais ordenadas às emoções, porque é necessário que elas sejam capazes de focar nos filhos, a fim de direcionar o desenvolvimento emocional e psicológico deles. Por exemplo, se um homem ficou responsável pelos filhos o tempo todo e um deles cai no chão, o homem, por causa da sua condição masculina de lidar com coisas difíceis, simplesmente vai ignorá-lo, para continuar a perseguir o que é certo. Quando ele vê a criança caída e arranhada, a maioria dos homens percebe intelectualmente que ela está bem, [...] mas não tem empatia. [...] Quando as crianças são mais novas, elas realmente têm necessidade da empatia da mãe que as faça reconhecer que isso que aconteceu foi uma coisa triste, mas, ao mesmo tempo, que as direcione para o fim certo." (7'10")

A inteligência emocional das mulheres, portanto, é um bem querido por Deus para o bom exercício da maternidade. Por outro lado, tendo em vista que as emoções afetam o julgamento racional, é melhor que as mulheres sejam conduzidas pelo homem ao invés de conduzirem. Por isso Deus também deseja que os homens assumam a responsabilidade pela liderança dos seus lares e da Igreja.

Pe. Chad Ripperger continua e afirma, assim como todos os Doutores da Igreja, que o pecado de Eva foi de tentar controlar Adão e sair da ordem natural estabelecida por Deus:

"Porque Eva rompeu sua submissão a Adão, ela agora e até o fim dos tempos teria essa desordem do pecado original de tentar se afastar de sua autoridade e até se ressentiria com ela. Essa desordem é o que o movimento feminista trabalha." (9'38")

Sendo assim, concluímos que o Instagram é uma péssima ferramenta para a mulher cultivar a virtude da docilidade, pois a todo instante ela precisa sustentar e ostentar uma posição de autoridade. No Instagram, as mulheres são incentivadas a serem líderes, o que é péssimo para a índole feminina.

Por isso tem aumentado a frequência de moças tradicionais que, à medida que usam o Instagram, vão se tornando progressivamente mais liberais e feministas.

3) Insubmissão. Por fim, o Instagram possibilita a mulher buscar várias "autoridades" sobre sua vida que não são a do seu marido e do seu diretor espiritual. Não é incomum, portanto, que o marido se surpreenda com mudanças repentinas de opiniões e pensamentos da mulher que utiliza Instagram, já que ele precisa disputar sua autoridade com outras mulheres ou com outros homens. A falta de controle no uso Instagram pode gerar casamentos profundamente infelizes. Esta é, sem dúvidas, uma das principais razões do crescimento do feminismo católico. A mulher tem buscado em outros homens e mulheres aquilo que deveria buscar no seu marido.

Remédios

A melhor medicina para esta situação é simplesmente não ter Instagram. A rede social traz mais malefícios do que benefícios. Contudo, se isso não for possível, é recomendável que a mulher siga somente alguns poucos perfis, tenha horários para acessar a plataforma e nunca siga pessoas que contrariam o entendimento do marido, caso tenha, e do sacerdote que guia a família.

É necessário, ademais, que o marido ajude a esposa a regular o uso do Instagram, conhecendo os perfis seguidos, recomendando ou desaconselhando um ou outro, não permitindo jamais que a mulher comece a virar uma espécie de coach ou diretora espiritual dos seus seguidores.

sábado, 14 de setembro de 2024

Paul Fahey, feministo do "Where Peter Is", fala groselha sobre Efésios 5

 

Recentemente, o colunista Paul Fahey do site católico progressista "Where Peter Is" publicou o artigo "What the Church no longer teaches about Ephesians 5" (O que a Igreja não ensina mais sobre Efésios 5). No corpo do artigo, Paul busca argumentar que a Igreja abandonou ensino da liderança do marido sobre a esposa. Para tanto, baseia-se em alguns fundamentos:

1. O silêncio recente da Igreja a respeito da liderança do marido;

2. A ênfase na ideia de submissão mútua;

3. A recente ponderação do Papa Francisco da necessidade de interpretação de certas passagens do Novo Testamento a respeito das mulheres.

Tratemos desses pontos um por um.

Quanto ao suposto silêncio da Igreja acerca da liderança do marido

Fahey argumenta que o "Magistério vivo" da Igreja, desde o Concílio Vaticano II, não têm usado a linguagem da "liderança" nos seus documentos magisteriais:
"Com isso em mente, é importante declarar que nem o Catecismo, nem qualquer outro documento de ensino pós-Vaticano II sobre o casamento usa a linguagem de “liderança”. Em sua Carta Apostólica sobre a dignidade das mulheres , São João Paulo II interpreta a linha de liderança de Efésios 5 como significando submissão mútua. Ele escreveu: “o marido é chamado de 'cabeça' da esposa como Cristo é a cabeça da Igreja”, mas “no relacionamento entre Cristo e a Igreja a sujeição é somente por parte da Igreja, no relacionamento entre marido e mulher a 'submissão' não é unilateral, mas mútua” (MD 24)."

Contudo, como demonstramos no artigo "O que significa a submissão mútua de São João Paulo II?" é falso que a Igreja após o Concílio jamais tenha usado a linguagem da liderança para se referir ao marido. Na Encíclica "Laborem Exercens", São João Paulo II chama literalmente o homem de "chefe de família":

"Uma justa remuneração do trabalho das pessoas adultas, que tenham responsabilidades de família, é aquela que for suficiente para fundar e manter dignamente uma família e para assegurar o seu futuro. Tal remuneração poderá efetuar-se ou por meio do chamado salário familiar, isto é, um salário único atribuído ao chefe de família pelo seu trabalho, e que seja suficiente para as necessidades da sua família, sem que a sua esposa seja obrigada a assumir um trabalho retribuído fora do lar." (n. 19)

Portanto, se São João Paulo II, autor da expressão "submissão mútua", é o mesmo Papa que ensina que o homem é "chefe de família", então não é lícito pensar que a Igreja, pelo fato de ter diminuído a ênfase no ensinamento da liderança do marido, tenha descartado essa doutrina.

Na verdade, a Igreja, de tempos em tempos, enfatiza certas doutrinas por razões pastorais e isso é absolutamente normal. Podemos concordar ou discordar se a estratégia está sendo eficaz ou não, mas a simples mudança ênfase não pode nos autorizar a simplesmente descrer na doutrina "negligenciada", se a Igreja expressamente não "descreu".

Ademais, Fahey ignora que o Magistério já estabeleceu que a estrutura hieráquica da família não é mutável.

Nesse sentido, Pio IX na Encíclica "Arcanum Divinae Sapientiae":

"Os deveres de ambos os cônjuges foram plenamente definidos e os seus direitos perfeitamente estabelecidos."

Pio XI em "Casti Conubii":

"O grau e o modo desta sujeição da mulher ao marido pode variar segundo a variedade das pessoas, dos lugares a dos tempos; e até, se o homem menosprezar o seu dever, compete à mulher supri-lo na direção da família. Mas em nenhum tempo e lugar é lícito subverter ou prejudicar a estrutura essencial da própria família e a sua lei firmemente estabelecida por Deus.

No livro "Casamento e Família", publicado pela Castela Editoral, encontramos as seguintes alocuções de Pio XII:

“Toda família é uma sociedade; toda sociedade bem ordenada exige um chefe, e todo poder de comandar vem de Deus. Por isso, a família que fundastes também tem um chefe a quem Deus conferiu autoridade sobre aquela que se doou a ele como companheira, e sobre as crianças que, com a benção de Deus, virão aumentar e alegrar a família.”

“Ó esposas e mães cristãs, não cedais nunca à tentação de usurpar o centro familiar! O vosso cetro amoroso deve ser o cetro que o Apóstolo das nações põe nas vossas mãos: a salvação pela maternidade.” 

“O conceito cristão do matrimônio, que São Paulo ensinava a seus discípulos de Éfeso e Corinto, é claríssimo: “As mulheres sejam submissas a seus maridos, como ao Senhor, pois o marido é o chefe da mulher, como Cristo é o chefe da Igreja.”. [...] Não provém essa doutrina e esse ensinamento de Cristo?”

Disto vemos que (i) a Igreja pré-conciliar ensina que a estrutura hierárquica da família não é apenas um condicionamento cultural, como Fahey quer nos fazer crer, mas uma realidade imutável; e que (ii) a Igreja pós-conciliar continua ensinando que o homem é verdadeiro chefe da família. Simplesmente não há espaço para jogar a carta do "Magistério vivo" para legitimar heresias feministas.

Quanto à ênfase na ideia de submissão mútua

Fahey adverte o "fato novo" da Igreja, a partir da encíclica "Mulieres Dignitatem", estar enfatizando mais a doutrina da "submissão mútua" dos esposos.

Bom, nos perguntemos então: Isto quer dizer alguma coisa? Se sim, isto quer dizer alguma coisa nova?

Fahey simplesmente não fala no que consistiria de "novo" aqui. Apenas deixa no ar e na insinuação como todo progressista com prurido de novidades gosta de fazer. Insinua que a "Igreja está mudando", que a "doutrina está sendo aos poucos alterada", mas não diz porque nem como.

No entanto, conforme explicamos no artigo "O que é submissão mútua de São João Paulo II?", a submissão mútua dos esposos nada mais é, em termos tradicionais, do que a reciprocidade de deveres do casal.

A razão dessa ênfase é assim explicada pelo escritor católico Germain Grisez:

“Até recentemente, o ensino papal enfatizava o dever de obediência da esposa; mas João Paulo II centra-se na submissão mútua dos cônjuges. As expressões retóricas dos ensinamentos papais anteriores e atuais refletem, é claro, contextos sociais muito diferentes; mas as proposições ensinadas devem ser consideradas, não como inconsistentes, mas como diferentes elementos de verdade, a serem integrados numa visão única e coerente.

Não se deve supor que João Paulo II rejeite a tradição. Dado que os papas, assistidos pelo Espírito Santo, tentam articular a mesma fé, na ausência de provas convincentes, não se deve pensar que os novos ensinamentos contradizem os antigos. Assim, se possível, os diferentes ensinamentos papais devem ser entendidos como compatíveis, e uma leitura cuidadosa mostra que podem ser.” (The Way of the Lord Jesus, vol. 2)

Ele continua:
"Não se pode ler nos ensinamentos de João Paulo II a negação do dever da esposa de obedecer ao marido sem supor que ele esteja dizendo que as esposas não precisam estar sujeitas aos seus maridos. Contudo, o Papa não diz isto, mesmo quando compara a dominação masculina à escravatura. Em vez disso, enfatizando que um marido deve amar a sua esposa de uma forma abnegada, ele afirma que a sujeição deve ser mútua. A implicação não declarada é que, embora a esposa não precise submeter-se à dominação egoísta do marido, ela permanece sujeita à autoridade corretamente exercida por ele."

E depois conclui:

"Grande parte da nova ênfase no ensinamento de João Paulo II pode ser explicada por sua preocupação em reivindicar a dignidade das mulheres contra a dominação masculina. Quando um homem domina sua esposa, o abuso do seu papel perturba a harmonia entre dois aspectos essenciais do casamento: (i) comunhão de duas pessoas iguais em dignidade e direitos, e (ii) colaboração de duas pessoas com capacidades e funções corporais complementares. Quando o casal se sujeita um ao outro por reverência a Cristo, esses dois aspectos são inteiramente harmoniosos."

Como observamos, Grisez explica que a nova ênfase do ensinamento de São Paulo II se dá em razão da atual pastoral da Igreja de ressaltar a dignidade das mulheres contra o abuso de poder masculino. Em outras palavras, a ênfase dada à submissão mútua é simplesmente em razão do novo contexto social, e não por motivo de mudança doutrinária da Igreja.

Já indicamos neste blog que a Igreja nunca considerou a autoridade do marido sobre a esposa, em si mesma, um abuso de poder.

A ausência de mudança doutrinária fica ainda mais evidente com as declarações do Diretório Homilético Discatério para o Culto Divino, que esclarece que a "submissão mútua" nada mais é do que as mútuas responsabilidades dos esposos. A esposa continua devendo obedecer ao marido. "Em troca" o marido deve dar a vida pela sua eposa:

"A instrução do Apóstolo de que as esposas devem ser subordinadas aos seus maridos pode ser perturbadora para as pessoas de nossos dias; se o homilista não planeja falar sobre essa diretriz, pode ser mais prudente usar a versão mais curta da leitura. No entanto, as passagens difíceis das Escrituras geralmente têm mais a nos ensinar, e essa leitura fornece uma oportunidade para o homilista abordar um tema que pode ser desagradável aos ouvidos modernos, mas que de fato faz um ponto valioso e necessário quando devidamente compreendido. Podemos obter uma visão do significado deste texto consultando um semelhante, Efésios 5:21-6:4. Lá também Paulo está falando sobre as responsabilidades mútuas da vida familiar. A frase-chave é esta: "Sede submissos uns aos outros no temor de Cristo" ( Ef 5:21). A originalidade do ensinamento do Apóstolo não é que as esposas devem ser submissas aos seus maridos; que era simplesmente presumido na cultura de sua época. O que é novo, e distintamente cristão, é, primeiro, que tal submissão deve ser mútua: se a esposa deve obedecer ao marido, o marido, por sua vez, deve, como Cristo, dar a própria vida por sua esposa. "

Fahey ao falar de "submissão mútua" grita e espera por novidades revolucionárias, mas, para sua infelicidade, o que nos aparece é apenas o frescor da doutrina de sempre.

Quanto à recente ponderação do Papa Francisco sobre certas passagens do Novo Testamento a respeito das mulheres

Fahey, por fim, refere-se à resposta às dúbia feita Papa Francisco, em 2023, para insinuar que as passagens das Escrituras sobre a liderança do marido estão sob "revisão" do "Magistério Vivo" da Igreja, que hoje silencia sobre o tema. Vejamos a resposta dada pelo Papa:

“Embora seja verdade que a Revelação Divina é imutável e sempre vinculativa, a Igreja deve ser humilde e reconhecer que ela nunca esgota sua riqueza insondável e precisa crescer em sua compreensão. Consequentemente, ela também amadurece em sua compreensão do que ela mesma afirmou em seu Magistério. Mudanças culturais e novos desafios na história não modificam a Revelação, mas podem nos estimular a expressar melhor certos aspectos de sua riqueza transbordante, que sempre oferece mais. É inevitável que isso possa levar a uma melhor expressão de algumas declarações passadas do Magistério e, de fato, esse tem sido o caso ao longo da história.

Por um lado, é verdade que o Magistério não é superior à Palavra de Deus, mas também é verdade que tanto os textos da Escritura quanto os testemunhos da Tradição requerem interpretação para distinguir sua substância perene do condicionamento cultural. Isso é evidente, por exemplo, em textos bíblicos (como Êxodo 21:20-21) e em algumas intervenções magisteriais que toleraram a escravidão (Cf. Papa Nicolau V, Bula  Dum diversas , 1452). Esta não é uma questão menor, dada sua conexão íntima com a verdade perene da dignidade inalienável da pessoa humana. Esses textos precisam de interpretação. O mesmo se aplica a certas considerações no Novo Testamento sobre as mulheres (1 Coríntios 11:3-10; 1 Timóteo 2:11-14) e outros textos da Escritura e testemunhos da Tradição que não podem ser materialmente repetidos hoje” (resposta de 2023 a  Dubia).

O que de cara reparamos é que o trecho não menciona Efésios 5 e que o Papa Francisco não diz que esta passagem não pode ser repetida materialmente hoje. Se o fizesse, entraria em contradição com o Diretório Homilético, que ele mesmo aprovou, no qual se afirma que Efésios 5 pode ser repetido nas pregações.

O Papa também não diz que as passagens de 1 Coríntios 11:3-10 e 1 Timóteo 2:11-14 não podem ser mais ensinadas atualmente, mas apenas pondera que não podem ser repetidas materialmente, isto é, sem a devida contextualização e interpretação:

Por um lado, é verdade que o Magistério não é superior à Palavra de Deus, mas também é verdade que tanto os textos da Escritura quanto os testemunhos da Tradição requerem interpretação para distinguir sua substância perene do condicionamento cultural. [...] Esta não é uma questão menor, dada sua conexão íntima com a verdade perene da dignidade inalienável da pessoa humana. Esses textos precisam de interpretação.

Com efeito, ou tais trechos precisam ser contextualizados para distinguir o dogma da Igreja daquilo que é temporal, cultural ou disciplinar ou precisam ser interpretados para demonstrar a compatibilidade da posição da Igreja em alguns momentos históricos com a dignidade do ser humano. 

1 Coríntios 11,3-10 fala basicamente do uso do véu, ou seja, uma questão cultural dos povos e disciplinar da Igreja. Cabe, portanto, a distinção do que é dogma e do que não é.

Já 1 Timóteo 2,11-14 ensina que não cabe à mulher ensinar. Para os ouvidos modernos, o texto é verdadeiramente aterrador, dado que, hoje, temos tantas mulheres em posição de ensino. Contudo, a essência do texto revela duas coisas:

(i) que não cabe às mulheres, no contexto do casamento, a posição de ensinar como se fossem guias dos seus maridos;

(ii) que as mulheres devem ser modestas no falar, pois a loquacidade feminina tende a lhe induzir a muitos erros. As mulheres possuem uma inteligência mais emocional que a dos homens. Por isto, ensina o Apóstolo, devem se preocupar mais em aprender do que falar. São Paulo ensina que quando a loquacidade feminina foi protagonista, ou seja, quando a mulher quis domar o homem pelo ensino, a humanidade caiu no pecado original. O mesmo é dito por  Pio XII quando explicou em 1949 a razão do homem ser o chefe do gênero humano. Ensina o Papa que o homem não se deixou enganar pela serpente e nem pela mulher, mas pecou em razão da sedução de Eva:

“Sim, a autoridade do chefe de família vem de Deus, assim como veio de Deus para Adão a dignidade e a autoridade de primeiro chefe do gênero humano, dotado de dons que transmitiria à sua posteridade. Por isso, Adão foi criado primeiro, e Eva depois. E, como diz São Paulo, Adão não foi enganado, mas foi a mulher que se deixou seduzir e transgrediu.” (Alocução aos recém-casados, de 10 de setembro de 1949:)

O homem é mais difícil de enganar por ter uma razão mais objetiva que a das mulheres. Por isso a liderança naturalmente lhes convém mais.

Essas lições são muito preciosas e explicam muito a razão de muitas moças católicas, na medida que usam, por exemplo, o Instagram, para serem "autoridades", ficarem mais progressistas e, quase sempre, caem no malfadado feminismo. Mulheres tendem a se perder quando concorrem com os homens por liderança. 

Por isso ressalta São Paulo que a salvação da mulher vem pela maternidade. É na esfera da educação dos filhos (não do marido) que sua contribuição de ensino é valiosa. Em regra geral, se a mulher tentar dominar seu marido, o resultado será a ruína da família.

Quem nunca reparou que nos primeiros anos escolares a maioria dos professores são mulheres, mas, quando começa o Ensino Médio, a maioria já é de homens? Não é esta uma forma de ilustrar que a esfera adequada do ensino da mulher é junto aos filhos? Não ilustra a inadequação de uma mulher ficar guiando homens adultos?

A passagem de Timóteo, portanto, precisa ser explicada. Ela não quer dizer que a mulher nunca pode ensinar, e sim que devem ensinar na sua esfera adequada.

Vemos assim que Fahey erra em todas as ponderações que faz. Mas por que esse sujeito erra tanto? Primeiro, por não ter fidelidade real ao Magistério. É um continuísta cooptado por progressistas, o que facilmente se degenera em modernismo. Assim, se o Magistério enfatiza certas doutrinas e não outras em certo período histórico, a cabeça dele já pensa em termos de "mudança doutrinal", "evolução do dogma", e não em uma eventual pastoralidade adotada pela Igreja para uma determinada circunstância. Em segundo lugar, por culpa dos pastores. A expressão "submissão mútua", de fato, não é muito bem explicada pelos pastores. Este blog precisou fazer uma acurada investigação para esclarecer o significado da expressão. Inserir expressões não tradicionais na Teologia é perigoso. Deixar ao vento expressões que, aparentemente, contradizem o Magistério anterior sem dar muita explicação, é abrir terreno para o Inimigo das almas e para os mestres do erro.

segunda-feira, 26 de agosto de 2024

Comungar na língua e de joelhos é superior a comungar na mão e de pé? Sim e podemos provar.


A superioridade da comunhão na língua

A comunhão na língua, como ensinou Paulo VI na instrução "Memoriale Domini", foi um desenvolvimento oriundo de uma maior compreensão do mistério eucarístico e da reverência devida ao Sacramento da Eucaristia:

"Posteriormente, com uma (i) compreensão mais profunda da verdade do mistério eucarístico , de seu poder e da presença de Cristo nele, sobreveio (ii) um maior sentimento de reverência, para com esse sacramento e sentiu-se que se demandava uma maior humildade quando de seu recebimento. Foi, portanto, estabelecido o costume do ministro colocar uma partícula de pão consagrado sobre a língua do comungante.

Esse método de distribuição da Santa Comunhão deve ser conservado, levando-se em consideração a situação atual da Igreja em todo o mundo, não apenas porque possui (iii) por trás de si muitos séculos de tradição, mas especialmente (iv) porque expressa a reverência do fiel pela Eucaristia"

Se resumíssimos as razões dadas por Paulo VI para a comunhão na língua seriam quatro:

1. a compreensão mais profunda do dogma da Transubstanciação;

2. um maior sentimento de reverência do fiel;

3. a longevidade da tradição;

4. a demonstração inequívoca da piedade do fiel.

A comunhão na língua demonstra inequivocamente maior devoção ao sacramento e presume maior compreensão do mistério que ele exprime.

A comunhão na mão não goza dessa presunção. A comunhão na mão "reverente" não é presumida, mas deve ser demonstrada. Para que esta maneira de comungar seja minimamente lícita, a Igreja estipula que:

(i) os pastores se certifiquem que os fiéis saibam distinguir o corpo de Cristo do pão comum;

(ii) o fiel comungue na frente no sacerdote;

(iii) as espécies eucarísticas sejam unicamente a espécie do pão;

(iv) esteja afastado todo perigo de profanação entre os fiéis. Se houver risco, a comunhão será na boca;

(v) o fiel não tome por si a comunhão;

(vi) a permissão da Conferência Episcopal e a confirmação da Santa Sé.

Agora, para que ela seja mais reverente é recomendado ao fiel:

(i) fazer uma inclinação antes de comungar, se for receber a comunhão de pé;

(ii) comungar protegido com uma patena.

A quantidade de coisas que precisa ser feita para tornar a comunhão na mão minimamente lícita e reverente demonstra cabalmente que este modo de recepção da Eucarista não goza da mesma presunção de dignidade e ortodoxia da comunhão na língua.

No rito romano tradicional não é preciso sequer a pessoa reafirmar sua fé na Eucaristia dizendo "Amém" quando o sacerdote lhe apresenta o Corpo de Cristo. A postura de comungar na língua já diz tudo.

A superioridade da comunhão de joelhos

É possível defender que a comunhão de joelhos seja superior enquanto reverência a comungar de pé?

Sim, é evidente que sim.

Os gestos humanos significam coisas e alguns mais do que outros. Quem o nega relativista é.

Um exemplo disso é a linguagem dos afetos. Um homem que abrace uma mulher pode estar demonstrando estima e amizade por ela. Mas um homem que a beije nos lábios demonstra inequivocamente um gesto de atração sexual.

O mesmo ocorre nos gestos de devoção. Ajoelhar-se perante alguém sempre foi e sempre será a linguagem universal inequívoca da devoção.

As Escrituras o atestam:

"Vinde, inclinemo-nos em adoração, de joelhos diante do Senhor que nos criou." (Sl 94,6)

“Tudo isso te darei se, prostrado, me adorares." (Mt 4,9)

"Por minha vida, diz o Senhor, diante de mim se dobrará todo joelho, e toda língua dará glória a Deus." (Rm 14,11)

"Por isso Deus o exaltou à mais alta posição e lhe deu o nome que está acima de todo nome, para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho, no céu, na terra e debaixo da terra." (Fl 2:9-10)

"Por esta causa dobro os joe­lhos em presença do Pai, ao qual deve a sua existência toda família no céu e na terra." (Ex 3,14-15)

Não há dúvidas que ajoelhar-se é a linguagem física universal da devoção. É impossível questioná-lo. É autoexplicativo.

Muitos podem até dizer que ficar de pé pode ser um gesto de reverência. É verdade, mas tal postura não significa inequivocadamente devoção a não ser em contextos muito específicos.

Por isso, embora a Igreja permita a comunhão de pé no atual rito romano, ela recomenda que o fiel faça uma inclinação profunda antes (IGRM, n. 160).

Durante a consagração ajoelhar-se ou inclinar-se ainda é obrigatório:

"Ajoelhem-se, porém, durante a consagração, a não ser que por motivo de saúde ou falta de espaço ou o grande número de presentes ou outras causas razoáveis não o permitam. Contudo, aqueles que não se ajoelham na consagração façam uma inclinação profunda enquanto o sacerdote faz genuflexão após a consagração." (IGRM, 43)

Ou seja, a postura de pé, em regra, precisa ser complementada por outro gesto de reverência, pois não basta por si só.

Ajoelhar-se também significa uma atitude penitencial, o que é muito conveniente para o momento da comunhão. Afinal, a Eucaristia apaga uma multidão de pecados veniais e não sendo ela um prêmio para os perfeitos, mas remédio para os fracos, é conveniente que o pecador mostre fisicamente uma atitude penitencial.

Portanto, devemos dizer sem papas na língua: o desenvolvimento litúrgico do rito romano tradicional de exigir a comunhão de joelhos foi um progresso, sim, superior, que muitos outros ritos não tiveram.

Não é possível mais, sem cair num relativismo grosseiro, defender que a comunhão de joelhos e na boca é tão reverente quanto a comunhão de pé e na mão. Simplesmente não há igualdade entre as duas coisas.

sexta-feira, 16 de agosto de 2024

Por que a católica moderna odeia o véu?

 

No último dia 15.08.2024, a colunista católica Jules Freitag, de quem já tratamos brevemente aqui, publicou novos stories divulgando um desabafo de uma seguidora sua a respeito do véu:



A seguidora de Jules alega que sente vontade de frequentar a Missa Tridentina, mas que não suporta a "radtradice" de uma ver cartaz na entrada da Igreja sobre como os fiéis devem se vestir e o oferecimento de véu para as moças usarem.

Jules então complementa: "A Igreja Católica não obriga ninguém a usar véu. A Igreja Católica não obriga ninguém a usar saia midi. Sabem onde é que existe a obrigação de usar véu e usar saia abaixo de joelho? Na Contregação Cristã do Brasil. Repitam comigo: ser católico não é fazer cosplay da Congregação Cristã do Brasil."

Primeiramente, lidemos com o desabafo de sua seguidora, depois com Jules.

"Vaidade das vaidades"

Quantas toneladas de vaidade uma mulher precisa ter para deixar de receber os benefícios espirituais da Missa Tridentina, simplesmente porque não quer usar véu por 1 horinha, uma prática, no mínimo, prescrita pelas Sagradas Escrituras, ordenada pelos Papas e assumida por todas as católicas do mundo por 2 mil anos até a década de 70?

Por que para essas moças se adequar ao costume local por 1h é quase a morte? Se fosse um costume contrário à lei da Igreja ou mau, poderia-se entender. Mas trata-se de um costume imemorial e saudável para a dignidade da liturgia. A ojeriza a se adequar a ele por breves minutos revela a completa falta de humildade e o espírito de insubordinação dessas moças.

A moça ainda acha um absurdo um padre colocar um dress code em sua igreja. Ora, mas dress code é solicitado inclusive pelas autoridades civis em repartições públicas como indicamos aqui. Por que então a moça se revolta quando um padre, que detém maior autoridade que os poderes civis, estipula parâmetros de modéstia para entrar no templo?

Jules e sua batalha contra o véu

Jules complementa o comentário da seguidora com falsidades. Alega primeiramente que a Igreja não exige o uso do véu. Contudo, demonstramos no artigo "O uso piedoso do véu não é mais obrigatório" que esta afirmação é falsa.

Todavia, ainda que não fosse mais obrigatório, o uso do véu teria força vinculante nos lugares onde ele é costumeiramente utilizado, pois, segundo o cân. 28 do Código de Direito Canônico:
Cân. 28 — Salvo o disposto no cân. 5, o costume quer contra a lei quer para além dela, revoga-se por costume contrário ou por lei; porém, a não ser que deles faça menção expressa, a lei não revoga os costumes centenários ou imemoriais, nem a lei universal os costumes particulares.

Com efeito, ainda que o uso obrigatório do véu fosse contra legem (contra a lei da Igreja), como não houve sua expressa revogação ou publicada nova norma tornando-o opcional e sendo ele um costume imemorial e centenário, o seu uso continua vigente e vinculante nos lugares em que é costumeiro.

Portanto, prova-se mais uma vez que, ainda que o uso do véu não fosse obrigatório na maioria das paróquias, ele o seria em ambientes que costumeiramente se guarda essa disciplina.

Pergunta-se, ademais: Seria pecado não usar véu nesses ambientes?

A resposta é depende. Se uma moça não cobre os cabelos por puro desaviso, não peca. Contudo, se rejeita cobri-los por desprezo ao costume local ou para espalhar uma moda contrária, peca. Neste sentido, ensina Antonio Royo Marín a respeito de vícios contra a modéstia no vestir:

"Vícios opostos. Embora contra esta, como contra as demais virtudes, seja possível pecar por excesso ou por falta, há muitas maneiras de incorrer em um ou outro extremo. Eis aqui as principais desordens que Santo Tomás aponta em um artigo escrito há sete séculos, e que é hoje de palpitante atualidade (II-II, 169, 1).

1ª Quando no modo de vestir se contrariam os salutares costumes de um povo. E cita as seguintes palavras de Santo Agostinho: "Uma convenção estabelecida em uma cidade ou em um povoado, seja pelo uso ou pela lei, não pode ser pisoteada pelo capricho de um cidadão ou de um estrangeiro." Meditem-no as autoridades encarregadas de velar pela moralidade pública diante da invasão desavergonhada de tantos "turistas" estrangeiros." (Teologia Moral para Leigos, n. 512.2)

Jules, por fim, diz: "Sabem onde é que existe a obrigação de usar véu e usar saia abaixo de joelho? Na Contregação Cristã do Brasil. Repitam comigo: ser católico não é fazer cosplay da Congregação Cristã do Brasil."

Corrijamos Jules. A obrigação de usar véu foi originalmente ordenada por São Paulo, um católico. Depois reiterada por São Lino Papa, um católico. Após ensinada pelos Santos Padres e os Escolásticos, todos católicos. Por fim, o Papa Bento XV, um católico, prescreveu o uso do véu no CDC 1917. Portanto, o uso bimilenar do véu prova que ele nunca será uma imitação ou um "cosplay" da Congregação Cristã, fundada apenas no século XX. O deboche de Jules é uma depreciação objetiva e mentirosa de um costume totalmente católico.

Jules também erra sobre os vestidos que cobrem o joelho. Entende ela que só existe a obrigação de cobri-lo na Congregação Cristã do Brasil. Não, Senhora. A Igreja também prescreve a mesmíssima coisa.

Papa Pio XI em 1930:
“Recordamos que um vestido não pode chamar-se decente se tem um decote maior que dois dedos abaixo da concavidade do colo, se não cobre os braços pelo menos até o cotovelo, e escassamente alcança um pouco abaixo do joelho. Ademais, os vestidos de material transparente são inapropriados.” (12 de janeiro de 1930)

Museu do Vaticano:

"Homens: calças pelo menos na altura do joelho. No verão é possível usar calças curtas mas os joelhos devem estar cobertos.

Mulheres: é proibido aparecer com as mangas descobertas. No verão a solução pode ser trazer um cardigan ou uma ombreira para usar dentro dos Museus. Calças ou saias devem cobrir até o joelho. É absolutamente proibido usar top que deixe a barriga aberta"

Código de Vestimenta da Basílica de São Pedro:

Código de vestimenta para a missa
Durante a missa na Basílica de São Pedro, homens e mulheres são obrigados a cobrir seus joelhos e ombros. Os homens podem usar calças e camisas, enquanto as mulheres podem usar saias longas ou vestidos, devendo ambos cobrir os joelhos. As mulheres podem usar chapéus para a missa, entretanto, os homens devem tirar os chapéus antes de entrar na Igreja.

A Basílica de São Pedro inclusive já adotou cartazes ilustrativos sobre como as pessoas devem se vestir:

Notemos que essas orientações são dadas não por causa de algum costume local, mas porque os espaços são sagrados e merecem respeito.

Basta. O exposto é suficiente para demonstrar o ridículo que Jules e de sua seguidora estão passando. Essas moças estão chamando a Igreja Católica de cosplay de CCB, isto é, de seita herética, por causa de hábitos e costumes perfeitamente normais em um católico.

O fato de estarem agindo assim só indica o quão apartadas estão de amizades e comunidades eclesiais minimamente saudáveis e conectadas com a Tradição perene da Igreja.

As causas do ódio ao véu

Já expusemos devidamente o erro de Jules e de sua seguidora. Mas a pergunta que nos sobra é: por que a católica moderna é tão avessa ao uso do véu?

Consideramos algumas causas prováveis do fenômeno. Ei-las:

1. Feminismo. A mentalidade igualitária do feminismo que hoje sufoca o mundo não deixou ilesa as católicas, mesmo as que se dizem conservadoras. Conforme temos exposto neste blog, são inúmeras as católicas conservadoras que demonstram ter uma mentalidade tipicamente feminista sobre as coisas. O uso do véu lembra a católica que o mundo não é igualitário e o mero símbolo que o véu traz de uma autoridade acima da cabeça da mulher a incomoda profundamente, pois a principal característica da mulher moderna é a insubordinação e a falta de docilidade. Mulheres, ademais, são ensinadas desde criança a serem iguais aos homens em tudo, isto é, no modo de vida e na maneira de vestir. A simples sugestão de que devem se vestir diferente é, para elas, altamente ofensiva. O que explica a seguidora de Jules se ofender com o simples oferecimento do véu. Católicas feministas um pouco mais formadas podem até aceitar as razões do uso do véu, mas nunca usarão. Impera em suas mentes o princípio "a mulher deve se vestir como ela quiser".

2. Liberalismo. A ideia de que o homem é liberto de normas e de Deus inundou a mente das católicas. Ainda que elas não rejeitem Deus e a Igreja, muitas terão um liberalismo mitigado expresso com uma profunda desconfiança das regras, dos padrões e dos princípios. Chamarão tais coisas de "rigorismos" e "moralismos" excessivos, mas nunca apresentarão os critérios que consideram normais e corretos. Muitas chegam ao cúmulo da contradição, que só poderíamos representar por meio da seguinte sátira:

23h59: Modéstia é se conformar com o costume local. Por isso é válido usar biquíni na praia e legging na academia.

00h00: Não vou usar "paninho" na cabeça. Não sou obrigada. Dane-se a Missa Tridentina, dane-se o costume.

3. Vaidade. O uso do véu transporta para a mulher uma aparência de pureza e, principalmente, de inocência. A mulher moderna repudia a inocência feminina, pois aprecia a rudez masculina. Ela precisa ser a "mulher forte", a mulher "sabe tudo". Num mundo feminista, a inocência, neste caso, é uma fraqueza, uma humilhação. Portanto, para uma católica moderna, é melhor nunca ver um rito venerável como a Missa Tridentina do que passar a impressão de que é frágil.

4. Moda. Muitas católicas rejeitam o véu porque o consideram, assim como Jules, "brega", "cafona", "fora de moda", coisa da Congregação Cristã. Possuem medo de parecerem ridículas. Assim, rejeitam o véu por acharem que ficarão bregas ou porque sua beleza ficará escondida dos outros. Devemos, no entanto dizer, que tudo isso é pura vaidade. Não lhes passa pela cabeça que cobrir a cabeça nunca foi uma questão de moda, mas de respeito para com o marido e de devoção para com Nosso Senhor. E que é perfeitamente louvável usarmos alguma roupa que desgostamos, se o fizermos por penitência ou por reverência a Deus, como ensina Santo Tomás:

"Não peca sempre quem usa de roupas mais vis que a dos demais. Assim, se o fizer por jactância ou soberba, julgando–se superior aos outros, cai no vicio da superstição. Se, porém, proceder desse modo para mortificar a carne ou por espírito de humildade, praticará a virtude da temperança. Por onde, diz Agostinho: Quem usa das coisas mais estritamente que o permitem os costumes daqueles com quem convive, ou é temperante ou e supersticioso. – Mas sobretudo cabe usar de roupas mais vis aqueles que exortam os outros, pela palavra e pelo exemplo, à penitência. Por isso, uma Glosa ao Evangelho diz: Quem prega a penitência traga um hábito de penitente." (S. Th. II-II, q. 169, a.1, ad 2)

Portanto, uma mulher que acha brega o véu, mas o usa por reverência a Nosso Senhor, pratica verdadeiramente a humildade e têm muito mérito perante Deus.

5. Consciência laxa. Por ser filha do liberalismo, a mulher moderna tende a ser laxa nos hábitos. Quando já se está acostumada a vestir biquínis ou leggings para mostrar o corpo, tirar fotos na academia e mostrar no Instagram, esconder a si mesma num véu é quase uma repreensão. De fato, o uso do véu é muito duro para quem tem consciência laxa, principalmente acerca da modéstia.

6. Igualitarismo no Novus Ordo. Nas paróquias do Rito de Paulo VI, exceto a celebração da Eucaristia e a pregação do Sermão, nenhuma outra função é exclusiva de homens ou de mulheres conforme a conveniência de cada sexo. Todos fazem tudo. É muito mais difícil demonstrar que mulheres não são iguais a homens, porque, de certa forma, o rito imita o modo de vida da mulher moderna. No Rito Tradicional, ao contrário, meninos servem o altar e mulheres usam o véu. Não há espaço para ideologia de gênero.

7. Paróquias ruins. Quase nenhuma paróquia hoje em dia ensina sobre a importância das devoções tradicionais da Igreja. Talvez, a devoção mais negligenciada na formação paroquial seja a do véu. Moças que nunca tiveram o exemplo de suas paróquias têm imensas dificuldades de acolher o uso do véu. Muitas delas se sentem envergonhadas de usarem o véu sozinhas. Contudo, é preciso dizer que se não começarem o bem nunca será feito. Os tempos modernos, infelizmente, requerem de nós um espírito audaz e sacrificial até mesmo para fazer o bem.

8. Animosidade desordenada contra grupos tradicionais. Há moças que não usam véu por animosidade descontrolada contra grupos tradicionais. Tais moças odeiam tradicionalistas a tal ponto que não suportam sequer a ideia de se assemelharem a uma mulher vinculada a eles. Não são capazes de fazer a distinção de que o véu é um patrimônio católico, não desde grupo ou daquele. Ademais, a incapacidade de ver inclusive as virtudes dos seus desafetos as impedem de olhar a importância do uso do véu com a devida racionalidade.

Remédios

Para todos os problemas citados acima o remédio é o uso do véu e o estudo da sua devoção. Não nada mais poderoso contra o feminismo e a vaidade do que o véu. Nada mais eficaz contra a laxidão, o liberalismo, a animosidade desordenada contra tradicionais do que o uso e o estudo do véu.

O estudo do véu releva as verdades sobre o matrimônio, sobre a ordem da criação, a nossa devoção para com Deus e sobre a virtude da temperança.

Uma católica de boa consciência nunca irá depreciar o véu piedoso ou tratá-lo como algo não católico. Rezemos para que as moças que assim agem compreendam o mal que dizem e fazem e se juntem a nós pela restauração dessa salutar e poderosa devoção.

terça-feira, 13 de agosto de 2024

A Raiz da Guerra Litúrgica (KEVIN TIERNEY)

Na época em que era chefe do Prefeito da Congregação do Culto Divino, o Cardeal Robert Sarah pensou muito e profundamente sobre o papel que a liturgia desempenhava na formação dos católicos. Ele passou um tempo não apenas refletindo sobre os frutos de uma formação litúrgica adequada, mas como a liturgia, quando abordada de forma errada, poderia formar católicos de forma não intencional. Em uma conferência litúrgica de 2017 em Colônia, o prefeito alertou sobre uma liturgia que era uma ocasião para divisões odiosas, para confrontos ideológicos e para humilhações públicas dos fracos por aqueles que afirmam ter autoridade, em vez de ser um lugar da nossa unidade e da nossa comunhão no Senhor

Nisto, o Cardeal Sarah estava discutindo a temida “guerra litúrgica” que vem acontecendo, com intensidade diferente, no Rito Romano desde a promulgação do Novus Ordo Missae por Paulo VI em 1969. Entre alguns dos católicos mais fervorosos, a liturgia se tornou não uma ferramenta de adoração a Deus, mas uma linha de batalha em uma batalha maior sobre como a Igreja aborda o sagrado. Como muitas guerras de trincheiras, muito pouco é realizado por ela além de baixas. Ninguém gosta da guerra litúrgica. No entanto, apesar desse ódio sem fim, a guerra litúrgica é tão desagradável em 2024 quanto era nas décadas de 1990 e 2000. Por quê?

Ao expor tal teoria, vou adotar uma posição que pode irritar alguns tradicionalistas. Vou assumir a posição de que a maioria dos indivíduos envolvidos no Novus Ordo (com algumas exceções) eram indivíduos bem-intencionados, mas equivocados. Vou sustentar (com algumas exceções) que as ações dos Papas desde o Concílio foram sinceras, mas, uma vez que se basearam em uma aposta falha, sinceramente erradas. Isso pode não ser para você. Que assim seja.

Minha teoria da guerra litúrgica não se baseia em "qual é superior", mas em algo decididamente não litúrgico. Paulo VI e outros ao seu redor acreditavam que os frutos da nova liturgia seriam autoautenticados. A reforma seria um bem óbvio que todos amariam, mesmo que demorasse alguns anos. Como parte do incentivo a esse amor, Paulo VI ordenou que os padres queimassem seus navios quando pisassem no novo mundo. Ele proibiu funcionalmente todos os padres do Rito Romano (com algumas exceções) de celebrar o antigo missal. Não haveria como voltar atrás, nenhuma introspecção, nenhuma revisão sobre se as reformas funcionaram ou não. Até mesmo sugerir que tais reformas deveriam ser medidas era questionar a capacidade do Papa de guiar a Igreja na adoração. O Papa não suprimiu formalmente a Missa Tradicional. Por que é uma incógnita. Sou da posição de que é uma proposição canônica arriscada suprimir, para todos, algo lícito e celebrado pela Igreja por séculos. Entrar nessa discussão coloca o propósito da lei da igreja, e da disciplina da igreja, de cabeça para baixo. Então ele tentou outros assuntos para obter aceitação. Para ser claro, aceitação é o que ele obteve.

A esmagadora maioria dos católicos aceitou a nova missa. Eles entenderam que agora era a missa que eles assistiriam todo domingo. O que eles nunca fizeram foi abraçar a Nova Missa. As reformas litúrgicas não levaram a um fiel católico participando mais profundamente da missa. Não levaram a uma compreensão mais profunda. Não levaram a um fervor maior. Em suma, as coisas que ela alegava que seriam melhoradas em relação à missa latina não aconteceram em substância. O que restou foi a preferência pessoal. As reformas se tornaram grandes não por causa do que elas entregaram, mas por causa do que elas permitiram: maior expressão pessoal, uma elaboração de uma missa em direção aos desejos dos fiéis. Por "desejos dos fiéis", quero dizer os desejos de uma burocracia litúrgica que acreditava ser a geração mais santa de católicos de todos os tempos, e o mundo deve experimentar seu brilhantismo. Quer eles quisessem ou não.

A Nova Missa sobreviveu somente com base no decreto papal. Para o revolucionário que queria mais mudanças, tais decretos significavam pouco. Para muitos católicos que só queriam encontrar um momento de paz e solidão para encontrar Deus aos domingos, esse decreto papal também não significava muito. A Nova Missa existia. Ela não iria embora. No entanto, ela nunca foi amada. Como ela nunca foi amada, isso também significava que a Missa Tridentina também nunca iria embora.

Diante dessa realidade (e foi uma realidade que eles encontraram dentro de uma década de 1969), a Igreja lutou para lidar com o fato de que uma previsão do ofício papal, com todo o poder da autoridade canônica, não aconteceu . Nesse ponto, a Igreja ganhou tempo. Eles concederam indultos a alguns na Inglaterra e no País de Gales. Acordos individuais foram feitos. Padres em situações canônicas ambíguas eram desaprovados, mas muitas vezes deixados em paz. Em 1984, Roma emitiu regras para indultos, baseadas na firme crença de que dentro de uma geração, aqueles que quisessem a missa tridentina estariam mortos. Em 1988, com a excomunhão de Marcel Lefebvre, essa situação se tornou impossível. Nesse ponto, o status da missa latina não estava mais sob o controle da Igreja e de seus bispos. No entanto, a Igreja também não podia admitir que sua aposta estava errada. Se estivesse errada, então a própria reforma litúrgica poderia ser questionada em uma questão fundamental.

Eles então tentaram abordar as críticas estéticas defendendo uma "reforma da reforma", que tentava adicionar de volta muitas das coisas que por décadas o papa, bispos e conselheiros litúrgicos demonizaram como pertencentes a um museu ou cemitério. Tudo o que a reforma da reforma fez foi levantar a questão fundamental: se podemos ter latim, ad orientem e comunhão enquanto nos ajoelhamos na grade, por que não podemos simplesmente ter a missa tradicional em latim?

Quando Bento XVI ascendeu ao trono, ele entendeu que a Igreja não poderia responder a essas perguntas, a Missa Tridentina não iria embora, e a quantidade de fiéis que se voltavam para ela estava crescendo. Enquanto isso, com igual intensidade, o desejo de proibir a Missa Tradicional estava evaporando. Como fazer isso sem admitir um erro? Aqui, o brilhante teólogo tropeçou em uma grande brecha. Já que Paulo VI simplesmente deixou de lado a Missa Tradicional, ele a deixaria de lado. Ela existiria ao lado da Forma Ordinária, e os fiéis e padres poderiam decidir por si mesmos. Ele queria resolver a discussão se afastando dela completamente. Ele declarou vitória, não para uma forma ou outra, mas para a diversidade litúrgica, e então foi para casa.

Se pareço insincero, não é minha intenção. É preciso ser um homem notável para admitir que tentativas anteriores do papado de resolver essa questão só pioraram a situação, então não vou fazer isso. Joseph Ratzinger foi facilmente o teólogo mais talentoso do século XX, e esse conhecimento o tornou ciente das limitações da Igreja e de sua pessoa. Embora não tenha sido uma decisão perfeita, foi um cessar-fogo na guerra litúrgica, com uma paz temporária negociada. Deixe o mundo recuperar o fôlego, e então negociaremos uma nova paz.

O problema com essa abordagem é que havia uma escola de indivíduos na Igreja que queriam continuar a ofensiva. Toda essa conversa sobre paz era equivocada. Se você fizer as pazes com o passado, o passado retornará. Se você permitir o passado como uma opção aceitável, ele sempre estará lá, esperando para ser adaptado aos tempos modernos, como uma alternativa ao que quer que o presente esteja fazendo. Embora não saibamos se ele sempre foi dessa escola, em 2019, estava claro que Jorge Bergoglio, agora Papa Francisco, foi convertido a essa visão de mundo. Sua geração estava morrendo. Ele próprio estava morrendo. Sua estrela estava em declínio. O que acontece quando eles morrem, e esse passado que Paulo VI tentou forçar as pessoas a ainda existe? Quando Francisco perguntou aos bispos do mundo se eles entendiam a ameaça que a missa tradicional representava para a unidade da Igreja, a maioria deu de ombros. Então ele emitiu Traditionis Custodes, para tentar forçá-los a ver a ameaça. Quando eles ainda não viam, ele tentou medidas cada vez mais coercitivas para fazer os bispos e os fiéis verem. No entanto, o problema fundamental permaneceu: ninguém ama a alternativa. Eles a aceitam. Eles constroem suas vidas em torno dela. A Nova Missa é parte da experiência católica das 9h às 17h. No entanto, eles não a amam.

Esta é a verdadeira raiz das guerras litúrgicas. Uma geração de líderes (do papa para baixo) operou em uma aposta. Eles continuaram a aumentar as apostas, finalmente indo all-in. Eles perderam, e agora devem voltar para casa e explicar à família por que eles não têm mais um carro ou uma casa, e como eles terão que se adaptar à família perdendo suas camisas. Não se preocupe, você aprenderá a gostar disso. (Ou como um autor católico popular disse uma vez, nós pecadores merecemos uma liturgia feia.) 

Você está inspirado?

Fonte: https://kmtierney.substack.com/p/the-root-of-the-liturgical-war


segunda-feira, 12 de agosto de 2024

Direita feminista atualiza novos delírios: "Homens de Verdade" e "Padrão de feminilidade causa transexualismo"

 

Neste blog já dedicamos algumas postagens para explorar a nova onda pandêmica entre católicas conservadoras: o feminismo.

Buscamos identificar padrões e argumentos de feministas católicas da forma mais abrangente possível e respondê-los, contudo, parece que o besteirol e o lixo feminista é interminável e a cada dia se renovam novos delírios e novas problematizações por moças profundamente afundadas no feminismo e na confusão mental.

O novo delírio feminista agora é da socióloga Geisiane Cristina Freitas, pesquisadora das relações raciais e de gênero, e da influencer Jules Freitag, colunista do site Church Militant e do Jornal BSM de Bernardo Küster.

Geisiane parece ser a típica "feminista acadêmica", ou seja, aquela que vela seu feminismo implícito em "pesquisas" e explicações sociológicas que quase sempre tem como "resultado" a reprovação das posições católicas sobre a mulher, algo que outras moças como Preta de Rodinhas e Letícia Barbano também fazem. Em outro momento explicaremos melhor sobre esse perfil. Já Jules é puro suco do que chamaremos aqui de "feminismo olavético", isto é, da católica outrora conservadora, mas que agora se reduz a criticar o conservadorismo de modo desbocado, debochado e revoltado.

Como dissemos em algumas oportunidades neste blog, o feminismo católico é completamente avesso a padrões de feminilidade, principalmente quando o tema é modéstia, tendo em vista a sua origem liberal. Por isso procura rotular padrões perfeitamente adequados para mulher (Ex: mulheres que usam véu, vestido e que trabalham dentro do lar) como uma "caricatura".

Geisiane e os "Homens de Verdade"

Uma nova variante desse ódio aos padrões foi apresentado por Geisiane e Jules. Geisiane possui um Destaque em seu Instagram chamado "Caricatura" e nele a socióloga critica o que chama de "feminilidade instagrâmica". Geisiane indica que "feminilidade instagrâmica" seria o conjunto dos perfis que reduzem a feminilidade a "ferramentos externas" e ao trabalho no lar. Ela considera que esses perfis agem igual o feminismo que compreende a feminilidade como uma "performance social".


Quanto à feminilidade externa, Geisiane não deu exemplos de perfis que reduzem a feminilidade apenas aos aspectos externos. Tudo o que sabemos é que a socióloga "surtou" quando o influenciador João Menna afirmou que mulheres deveriam andar maquiadas dentro de casa. Segundo Geisiane, o influenciador não estaria compreendendo a realidade da maioria das mulheres brasileiras e que ele ficar se importando com isso seria coisa de "tchola".


Contudo, nos perguntemos: é um tremendo absurdo a opinião de João Menna?

Aqui lembramos de um famoso caso narrado por Dom Rafael Llano Cifuentes em seu livro "Crises Conjugais". O bispo conta a história de Gilberto e Cida, um casal do qual ele era diretor espiritual. Narra Dom Rafael que numa direção Gilberto fez a seguinte reclamação:
"O meu casamento entrou em crise. Morro de tédio e monotonia. Todos os dias, quando me levanto, vejo a Cida despenteada, sem se arrumar, horrorosa, com os pés enfiados nuns chinelos horríveis que não troca faz quinze anos, arrastando-se pelos corredores, cansada... Abro a porta do quarto e encontro as crianças, que já são adolescentes, discutindo, brigando... A minha casa parece um zoológico...

«Depois, chego ao escritório e encontro lá a Mônica, uma estagiária. O panorama muda da água para o vinho. Ela é encantadora. Acho que tem uma queda por mim... Aproxima-se, charmosa...: "O senhor parece cansado...; não quer que lhe traga uma aspirina com uma coca-cola?" E afasta-se com um andar cadenciado que me arrebata... Estou perdendo a cabeça... Em casa, sinto-me acorrentado... Tenho necessidade de libertar-me. Por que condenar-me à prisão de um amor que já morreu? O contraste entre a Mônica e a Cidinha é muito forte... Não sei, não..." (p. 89)
A solução de Dom Rafael foi chamar Cida e dar-lhe o seguinte conselho:
"Veio a Cida, toda inocente, desarrumada, despenteada:

- Cida, por favor, arrume a «fachada» e... compre outros chinelos!

A Cida era inteligente. Foi ao cabeleireiro, comprou roupas novas, uns chinelos novos, tornou-se mais carinhosa com o Gilberto, preparou as «comidinhas de que ele gostava... e terminou  «reconquistando» o marido."

O conselho de Dom Rafael é essencialmente o mesmo de João Menna. A esposa deve se adornar para agradar o marido. Se é com maquiagem, penteado bem feito ou com roupas melhores dependerá do gosto de cada marido, mas o conselho é espiritualmente o mesmo.

Nesse sentido ensinava o Doutor Angélico:

"Pode contudo, a mulher aplicar–se licitamente em agradar ao seu marido, afim de que ele, por desprezo, não venha a cair em adultério. Por isso diz o Apóstolo: A mulher casada cuida das coisas que são do mundo, de como agradará ao marido." (S.Th. II-II, q. 169, a. 2).

Da mesma forma, São Francisco de Sales em "Filoteia"

"Uma mulher pode e deve se efeitar melhor quando está com seu marido, sabendo que ele a deseja." (A decência dos vestidos, cap. 25)

Será que essas moças adoentadas pelo feminismo irão brigar com Santo Tomás, São Francisco de Sales e Dom Rafael por eles serem "incompreesivos" com a realidade da mulher brasileira?

Ademais, há outra razão para o adorno de mulheres quando estão com seus maridos: favorecer a união mútua mediante o débito conjugal.

Uma mulher que não se cuida ou que é arrebatada pela rotina e se esquece frequentemente de adornar-se para o marido, geralmente, não está com o débito conjugal em dia e pode criar uma crise no seu casamento.

"Homens de verdade"

Muitas mulheres, no entanto, preferem negar essa realidade. Elas possuem a ingênua crença de que devem ser amadas por si mesmas sem precisar que façam ou se esforcem para alguma coisa. Assim, quando lhe são mostrados os deveres que devem cumprir ou os esforços que precisam fazer para manter um casamento, muitas delas apelam para a figura do "homem de verdade". O "homem de verdade" seria aquele que ama sua mulher sem que ela precise fazer nada para ser amada ou desejada. Portanto, um homem que não desejasse sua mulher nessas condições seria menos homem ou um "tchola", um "boiola", um "viado". Esse expediente é apenas uma variação de deboche, mecanismo amplamente usado pelo feminismo católico como dissemos no artigo "O Deboche como Arma do Feminismo Católico".

Este recurso foi utilizado por várias influenciadoras que acompanharam a polêmica como, por exemplo, a própria Geisiane, a pedagoga Ana Paula Sousa (@pur.ana), entre outras. Todavia, o melhor exemplo desse expediente talvez tenha sido o da professora de filosofia Natália Sulman, que fez uma postagem intitulada "O homem quer ver sua mulher sem roupa, não com maquiagem" e nela ela dá a entender que "homens de verdade" desejam suas mulheres bastando que elas sejam elas mesmas. Se isso não for suficiente, então "algo está de errado com ele". 

 

Contudo, como vimos, o adorno das mulheres para os maridos é orientado e mesmo ordenado por santos doutores e padres de larga experiência de direção espiritual, considerando a natureza masculina de ser muito visual. Certamente, se Cida ouvisse os conselhos de Natália Sulman e cia e não de Dom Rafael Llano Cifuentes, o casamento com Gilberto teria acabado.

O que nos leva à seguinte conclusão: mulheres que não fazem caso da sua "feminilidade externa" estão a um passo de destruir também a sua feminilidade interna, pois destroem o seu casamento e consequemente a boa vivência da maternidade.

Curiosamente, Geisiane, Natália e cia aplicam o mesmo veneno que dizem repelir: rejeitam qualquer enquadramento de feminilidade enquanto aplicam um enquadramento de masculinidade.

Quanto ao trabalho externo da mulher casada, Geisiane diz que não há nada mais feminino do que uma mulher sair de casa para trabalhar em prol dos filhos e pede para que as mulheres valorizem a sua própria realidade. Porém, como demonstramos no artigo "Trabalho da Mulher Casada e a Direita Feminista", a Igreja não presume lícito o trabalho fora do lar e o considera, em regra, uma injustiça social contra a mulher, porque a priva do reto cumprimento dos seus deveres domésticos e maternais, deveres estes que performam a sua autêntica feminilidade, pois foi para ser mãe que a mulher foi criada, não para ser escrava de inúmeros patrões. Como diria o Papa Francisco:
A realidade é que «a mulher apresenta-se diante do homem como mãe, sujeito da nova vida humana, que nela é concebida e se desenvolve, e dela nasce para o mundo». O enfraquecimento da presença materna, com as suas qualidades femininas, é um risco grave para a nossa terra.” (Amoris Laetitia, 173)
O correto, portanto, não seria valorizar a realidade decaída, mas tentar sair dela.

Jules: Padrão de Feminilidade Causa Transexualismo

Jules, por sua vez, pega o gancho de Geisiane e afirma que a "feminilidade instagrâmica" favorecerá o aumento de transexualismo em uma sequência de stories:

   


Jules bate numa genérica "caricatura de feminilidade católica", mas não define o que é a feminidade católica autêntica. Traduzamos então o que ela provavelmente quer dizer: não existem padrões fixos de feminilidade. Entende ela que padrões fixos ajudam a fortalecer o movimento trans, porque uma moça confusa que não se visse nesses padrões se enxergaria como um "homem".

O argumento, no entanto, é um absurdo completo. O que sempre fortaleceu o movimento LGBT e a ideologia de gênero nunca foi o estabelecimento de padrões de feminilidade, mas a destruição deles, o qual o feminismo é o principal contribuinte. O feminismo é o maior defensor da "diversidade" quando o assunto é feminilidade. E é exatamente o que Jules está fazendo. Ela acusa perfis católicos de serem muito "rígidos" na definição de feminilidade e, consequentemente, de mulher, como se houvesse uma infindáveis variações de feminilidade e não algo que pudesse ser condensado numa pessoa só, a saber, na Virgem Maria, e imitado por tantas outras pessoas.

A menos que Jules mostre ou defina o que é a sua ideia de autêntica feminilidade, o seu ataque à "feminilidade católica" só tem um efeito: fazer muitas moças desistirem de buscarem ser mais femininas. Em outras palavras, é Jules que estará favorecendo o Movimento Trans.

Conclusão

O que notamos tanto no comportamento de Geisiane, Jules e de outras moças conservadoras é cada vez mais a rejeição de algum conceito de feminilidade. Se alguém defender que mulheres devem voltar a usar saia e vestido como sempre usaram, alguma delas dirá que isso é "cagação de regra" da "seita da saia". Se alguém disser que as famílias deveriam lutar para que as mães não precisem trabalham fora, então alguma feminista católica dirá que tal pedido é reduzir a mulher a um papel burguês do século XIX. Se alguém disser que a mulher deve estar bonita para o marido, alguma delas também dirá que isso é um desrespeito com as "mães trabalhadoras" que não tem tempo pra se olhar no espelho. Ou seja, de pouco em pouco, evapora-se qualquer conceito possível de feminilididade que não seja apenas as diferenças anatômicas entre homem e mulher. Não lhes basta compreender que um ideal de feminilidade deve existir e que os casos concretos serão analisados segundo as circunstâncias concretas. Não, é preciso atacar o ideal. É preciso rotulá-lo de "cagação de regra" contra a mulher, é preciso chamá-lo de "caritura", é preciso ainda fazer múltiplas "problematizações", para que o ideal não seja vivido nem tentado.

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