quarta-feira, 19 de junho de 2024

O Catequista e a Opção Preferencial pelo Laxismo

A página "O Catequista" publicou em seu Instagram um feed respondendo uma pergunta sobre festas de casamento LGBT. A pergunta e resposta seguiram o seguinte teor:

"Católicos podem prestar serviços para essas cerimônias? 

Profissionais autônomos e empresários católicos, muitas vezes, ficam em dúvida se devem ou não prestar serviço para cerimônias de casamento g@i. A resposta está na doutrina sobre a colaboração formal ou remota com o mal.

Não é pecado que um católico preste serviço em uma festa de casamento g@i (como confeiteiro, fotógrafo, cerimonialista, músico, etc.), pois a colaboração com o mal, nesse caso, é remota, e não formal.

São João Paulo II (Evangelium Vitae) explica que a cooperação formal com o mal acontece quando, com a sua ação, a pessoa participa diretamente na execução de um ato injusto. E também quando a sua ação sinaliza a aprovação daquele ato imoral."

O Catequista é conhecido por ser uma página católica de humor que busca explicar descontraidamente a doutrina católica. Contudo, sua característica principal dos últimos anos tem sido a sua tendência cada vez mais aberta pela OPL (Opção Preferencial pelo Laxismo), dando conselhos a dezena de milhares de pessoas altamente duvidosos e, muitas vezes, contrários à opinião comum dos teólogos.

Voltemos à postagem.

Primeiramente, notemos que a resposta do Catequista não versa sobre "matrimônios civis" LGBT, mas sobre festas, isto é, bailes e espetáculos que buscam comemorar a união entre pessoas do mesmo sexo. Em segundo lugar, O Catequista não se dirige para operários, mas para profissionais autônomos e empresários, ou seja, profissionais que possuem autonomia na prestação de serviços, isto é, de aceitar ou negar certo trabalhos.

O Catequista, infelizmente, não traz qualquer fonte que corrobore a sua interpretação de que a cooperação de profissionais autônomos e empresários numa festa imoral é apenas material. A alusão ao ensino de São João Paulo II em "Evangelium Vitae" apenas explica o que é a cooperação formal com o mal, porém não como ele se aplica a este caso concreto.

Tomemos, no entanto, para resolver essa questão, a definição fornecida pelo próprio O Catequista de cooperação formal com o mal, isto é, participação direta na execução de um ato injusto cuja cooperação sinaliza aprovação da má ação. A pergunta subsequente, portanto, é: qual ato injusto estamos falando?

Como aludimos acima, o objeto da postagem da página são as festas de casamento LGBT, em outras palavras, festas imorais, algo que O Catequista (ainda) não nega. Embora festas ou bailes em si mesmos não sejam imorais, a causa formal de uma festa LGBT seria a ideologia LGBT, isto é, a afirmação da licitude do pecado de inversão sexual. Portanto, uma festa realizada para especificamente reafirmar essa ideologia seria, em si mesmo, imoral.

Reformulemos então a pergunta: É lícito ao católico como profissional autônomo ou empresário organizar festas, espetáculos e bailes em si mesmo imorais?

O Catequista responde que a prestação de serviços nesses casos seria apenas uma cooperação remota. No entanto, é, no mínimo, descuidada a resposta da página.

Para demonstrar isso, façamos uma rápida exposição da doutrina da cooperação com o mal. Segundo a síntese do teólogo Dominic Prummer em sua obra "Handbook of Moral Theology", a cooperação com o mal seria descrita nos seguintes termos:

DEFINIÇÃO E TIPOS. A cooperação no mal é a concordância no ato pecaminoso de outra pessoa. Conseqüentemente, a cooperação difere do escândalo na medida em que este último causa a má vontade do pecador (por conselho, ordem ou exemplo), enquanto a cooperação pressupõe a má vontade do pecador e é um meio de trazer essa má vontade vontade até a conclusão em ato externo.

1. A cooperação é imediata se for cooperação atual no pecado ato pecaminoso de outro (como na prática do onanismo); é mediata se fornece outros atos ou objetos que não estão tão intimamente ligados ao pecado do agente.

A cooperação mediata é próxima se a ajuda prestada for imediatamente relacionada com o pecado de outra pessoa, como vender veneno a um assassino; é remota quando a ajuda não está tão imediatamente ligada ao ato do outro, como vender um campo a um judeu que possa construir nele uma sinagoga.

2. A cooperação é formal se for dada ajuda a outro para cometer pecado enquanto pecado; é material se cooperarmos apenas na ação física. Conseqüentemente, a cooperação formal é um ato que é mau em si mesmo, tanto por causa de seu objeto quanto por causa da intenção do agente. A cooperação material é em si um bom ato que é abusado por outra pessoa para cometer pecado.

234. PRINCÍPIO. A cooperação formal no pecado de outra pessoa é sempre pecaminosa; a cooperação material às vezes é permitida.

A cooperação formal inclui o consentimento para o pecado de outra pessoa. Portanto, é uma ofensa não só contra a caridade, mas também contra a virtude violada pelo pecado em que se coopera.

A segunda parte do princípio deriva do fato de que a cooperação material é em si um bom ato que é abusado por outro através de sua própria maldade. Portanto, tudo o que foi dito sobre os atos que são indiretamente voluntários em n. 23 pode ser aplicado aqui e é usado para resolver casos que frequentemente surgem sobre diferentes assuntos relacionados com a cooperação de empregados, trabalhadores, lojistas, comerciantes, etc.

Em reforço à exposição de Prümmer, como é sempre ilícita a cooperação formal, segue-se como seria a aplicação prática desses princípios para a cooperação material de uma ação gravemente proibida, segundo o teólogo Antonio Royo Marín:

"Princípio: a cooperação puramente material com o pecado alheio pode ser lícita nas seguintes condições: a) se a ação com a qual se coopera é lícita em si mesma boa ou indiferente; b) caso se tenha reta intenção; e c) se há causa justa e proporcionada à gravidade do pecado alheio e à próximidade do concurso que se lhe presta.

Combinando estas condições de todos os modos possíveis, eis aqui os resultados aos  quais se pode chegar: 

1º) A UMA AÇÃO GRAVEMENTE PROIBIDA (v.g. comer carne em dia de abstinência) pode-se prestar colaboração puramente material com uma ação em si boa ou indiferente (v.g., preparando a carne, servindo-a, etc); 
a) Cooperação próxima e necessária, somente para evitar um dano muito grave (v.g., perda do emprego, ruína total do negócio);

b) Cooperação próxima e não necessária, ou remota e necessária, para evitar um grave dano próprio (v.g., perda notável de dinheiro, graves desgostos familiares, etc.).

c) Cooperação remota e não necessária, por dano leve (v.g. perda de um ganho ordinário, a indignação transitória do pai ou do amo, etc)."

(Teologia Moral para Seglares, Moral Especial, Livro II, Tratado I , n. 554.3)

De início, percebe-se que a resposta do O Catequista é realmente inadequada, pois presume que toda cooperação material sem anuência ao pecado do próximo é remota. Contudo, no caso concreto da participação de músicos, cerimonialistas e fotógrafos em uma festa LGBT, é patente que a prestação de serviços transita, minimamente, entre a cooperação imediata e a cooperação mediata próxima com o mal.

Músicos atuam como animadores da festa tornando-a lúdica e atrativa. Sobre a participação deles em festas imorais, assinala Royo Marín novamente em sua "Teologia Moral para Seglares":

"Os músicos não podem colaborar em espetáculos, salas de festas ou bailes francamente imorais, a não ser com causa muito grave (v.g. ficar sem o soldo necessário para viver), e ainda então deverão buscar outro meio de vida o quanto antes lhes seja possível. (Moral Especial, Livro II, Tratado I , n. 554.4.f)

Portanto, tendo em vista que músicos podem trabalhar em tais festas apenas se tiverem um motivo muito grave, presume-se que a cooperação deles é, de fato, imediata ou mediata próxima.

Os cerimonialistas por sua vez são os grandes organizadores da festa de casamento. A cooperação deles não se pode dizer que é meramente material, pois eles organizam a festa tal como desejam os clientes. No caso presente, eles organizariam segundo a índole de uma festa LGBT. A cooperação deles presume assentimento com o pecado dos clientes. Portanto, a cooperação deles é formal. Nesse sentido, citamos a autoridade do teólogo Teodoro del Greco em seu "Compêndio de Teologia Moral":

"Organizar bailes imorais e escandalosos é grave pecado de cooperação no mal." (n. 147)

Soma-se ainda ao pecado de cooperação formal o escândalo que promovem esses profissionais ao organizarem tais festas. A respeito, novamente, citamos Royo Marín:

"Cometem gravíssimo pecado de escândalo os compositores da letra e da música, as empresas que os apresentam em seus salões, os atores que atuam neles e os que contribuem com seu dinheiro e aplauso para sustentar esses espetáculos. E pecam gravemente os que assistem a eles sabendo de sua imoralidade ou periculosidade. Se animam outros a fazer o mesmo, são réus de grave escândalo.
Sob outro aspecto, cometem gravíssimo pecado de escândalo o autor, o compositor, o empresários, os atores e os colaboradores de uma representação na qual se impugna ou se ridiculariza a religião, ou a fé, ou os costumes cristãos. Pecam gravemente os que assistam a ela, mesmo descontando o perigo próprio e toda a aprovação. do irreligioso enquanto tal." (Moral Especial, Livro II, Tratado I , n. 550.5.d)

Portanto, o cerimonialista que coopera numa festa que reafirma o pecado de inversão sexual também comete grave pecado de escândalo.

Fotógrafos, por sua vez, em boa parte dos casos, são chamados não apenas para tirar fotos como também para produzir "albuns de casamento". No caso de preparação de "albuns LGBT", eles seriam equiparados a artesãos que fabricam objetos injuriosos ao sacramento do matrimônio. Segundo Royo Marín, nunca seria lícito fabricar tais produtos:

"Não é lícito jamais fabricar, preparar ou vender coisas aptas unicamente para o pecado (v.g., preservativos ou produtos anticoncepcionais, livros ou imagens totalmente obscenos ou injuriosos contra Deus ou contra a religião, etc." (Moral Especial, Livro II, Tratado I , n. 554.3.b)

A cooperação assim, na maioria das vezes, é realmente formal, pois o fotógrafo é contratado para registrar  plasticamente ações gravemente proibidas pela Igreja e pela lei natural. Integra o trabalho do fotógrafo de uma festa LGBT, por exemplo, pedir para que os noivos se posicionem enquanto casal ou tenham momentos de intimidade (v.g, "beijo dos noivos") para o registro das fotos.

Por fim, no caso de cozinheiros e confeiteiros em festas LGBT, em geral, sua cooperação será remota. Mas será, na maioria das vezes, uma cooperação remota e necessária, pois, em regra, não se realiza festas sem oferecimento de comida e bebida. Em outras palavras, não existiria uma festa de casamento sem o trabalho deles. Conforme a explicação que oferecemos de Royo Marín, a cooperação neste caso só seria admissível quando houvesse ameaça de grave dano pessoal.

Conclusão

Nota-se como as nuances da cooperação com o mal são variáveis. Ao contrário do que alega O Catequista, é perfeitamente possível alguém cooperar remotamente com o mal e pecar, se a cooperação for necessária para a realização da má ação.

O Catequista ao simplificar, de maneira grosseira, que nunca há pecado na cooperação remota com o mal apenas demonstra sua total falta de intimidade com a Teologia Moral da Igreja.

Essas simplificações da página que favorecem uma mentalidade laxa não são escusáveis. O Catequista possui mais de 100 mil no Instagram e sua responsabilidade pelas orientações que fornece que dá é grave.

Que possam reaver a postura do apostolado e tratar da maneira adequada os assuntos que abordam.


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