segunda-feira, 12 de maio de 2025

Surpreendidos pela Esperança. Reações tradicionalistas ao Papa Leão XIV.

É evidente — e há evidências que não se provam, mas se sentem, como o perfume de uma vela recém-apagada — que existem tradicionalistas feridos, desconfiados, com olhos treinados para ver o erro antes da esperança. Homens endurecidos pela guerra, tão acostumados ao cerco que já não sabem distinguir o soar dos sinos do estourar das bombas. Sim, alguns deles ainda esperam o “Papa tradicional” como se esperassem um comandante para a última cruzada. E se não o veem surgir no balcão da bênção, franzem o cenho e armam o coração.

Mas eis o milagre: a maioria dos grandes nomes do Tradicionalismo, esses mesmos que há pouco estavam nas trincheiras, levantou os olhos... e baixou as armas. Porque não é sempre que o céu troveja — às vezes ele chora, às vezes sorri. E desta vez, parece que sorriu.

No dia 1º de Leão XIV, não ouvimos o som de escudos se batendo, nem de lanças se quebrando. O que ouvimos foi mais parecido com um suspiro.

— Taylor Marshall, que alguns esperavam encontrar de espada desembainhada, disse simplesmente: “Eu me submeto a Leão XIV.”

— Peter Kwasniewski, que raramente escolhe palavras leves, afirmou com sobriedade: “Considero esse pânico com Leão XIV um erro.”

— Michael Matt, veterano das trincheiras, exclamou: “Devemos dar a Leão XIV o benefício da dúvida. Não há razão para entrarmos em pânico.”

— Bonifácio, do Unam Sanctam, confessou, quase com ternura: “O Papa Leão parece ser um homem genuinamente bom. Senti por ele um afeto paterno sincero.”

— E o editorial do Rorate Caeli, com uma simplicidade desarmada, escreveu com singeleza: “Podem nos criticar o quanto quiserem, mas sentimos uma afinidade cada vez mais calorosa por Leão XIV. Que os católicos tradicionais deem ao novo Papa o amor, a estima, o respeito e as orações que ele merece. Livremente, sem medo, esperando o melhor.”

Ora, isso não é pouco. É como ver, depois de uma longa noite difícil de batalha, a primeira linha dourada da alvorada. Durante os últimos anos, o clima na Igreja foi de guerra — uma guerra fria, silenciosa e invisível, mas profundamente real. As palavras carregavam pólvora. Os olhares, suspeita. E os fiéis andavam como quem pisa em terreno minado, sem saber onde ainda se podia amar a Igreja sem ser acusado de ódio.

Mas, de repente — como num desses momentos em que o Céu resolve brincar de poeta — tudo mudou.

Não veio o raio. Não veio o trovão. Veio... uma brisa. Suave. Como aquela que Elias ouviu na caverna. Como o sopro que antecede a paz. Como a mão de uma mãe no rosto do filho assustado.

E então todos se entreolharam, como que saindo de um pesadelo, e perguntaram baixinho num misto de confusão e esperança: “Foi... Deus?”

E o que se seguiu foi estranho, belo, inesperado: do medo, nasceu o alívio; e do alívio, uma alegria tímida, mas verdadeira. Uma alegria que não grita nem dança, mas que chora em silêncio. Como quem, depois de muito tempo, reencontra um pai. E percebe que ainda é filho.

Muitos, ao olharem o trono de Pedro, esperavam encontrar um administrador tirano de ruínas, um burocrata de esperanças mortas, um eco do passado recente. E então — num gesto tão calmo que pareceu eterno — apareceu um homem que disse: “É necessário que Cristo cresça e eu diminua.”

Esperávamos um lobo. E vimos o Bom Pastor.

É uma dessas viradas que só o Céu sabe fazer. É uma daquelas ironias divinas em que só podemos sorrir, desconcertados e agradecidos.

Os católicos tradicionais foram pintados nos últimos tempos como se fossem demônios vestidos de rendas, vampiros da sacristia, inquisidores ressuscitados das cinzas. E ainda há viúvas de tiranias que os tratam como tal. Mas eles — injustamente acusados, caricaturados, abandonados como se fossem filhos malditos da própria Igreja — não pediam um papa tradicionalista. Pediam um pai. E agora que o veem surgir, muitos se descobriram prontos para amar — não por estratégia, nem por cálculo, mas porque o coração, depois de muito tempo sob o peso da cruz, finalmente respirou.

A verdade é que não viam a hora de poder amar novamente o pai. Porque o Papa não precisa ser um tradicionalista para ser amado. Basta, como Cristo, ser pai.

sábado, 3 de maio de 2025

Do Papa dos Superlativos à Pedra que Tropeçou: Uma breve análise do legado do Papa Francisco.


Com a morte do Papa Francisco, desapareceu da cena da história um dos pontífices mais comentados do último século — e, talvez, o único capaz de despertar ao mesmo tempo aplausos de protestantes liberais, suspiros de ambientalistas suecos e prudente silêncio de católicos que ainda acreditam no Catecismo. Mas o que se tornou mais evidente com sua partida foi um curioso fenômeno que floresceu em sua sombra: o culto à personalidade.

É um paradoxo digno de Chesterton: um Papa que dizia combater os personalismos se tornou o ídolo de um novo tipo de culto — o culto à figura do homem que destrói os cultos. Seus admiradores, em meio a lágrimas sinceras e hashtags performáticas, atribuem-lhe títulos que fariam corar os santos e estremecer os doutores: “O melhor Papa da modernidade”, dizem uns. “O maior dos últimos 500 anos”, garantem outros. E quem os proclama? Profetas de Nárnia, como Mike Lewis, ou paladinos do catolicismo líquido como Carlos Ramalhete. Nos portais progressistas, como o Where Peter Is, a impressão não é de que “onde está Pedro, está a Igreja”, mas sim de que “onde está Francisco, ali começa o Evangelho”.

No entanto, ao examinarmos serenamente seu legado — com o mesmo olhar que um camponês lança ao campo depois de uma tempestade —, não encontramos a solidez de uma grande colheita, mas sim a umidade de muitas palavras. O que se vê é mais bruma do que edifício, mais movimento do que direção. Passemos, pois, ao exame.

1. Uma Pastoral de Desconstrução

O Papa Francisco parecia entender a pastoral como um instrumento mais elástico do que sólido. Sua preocupação, ao que tudo indica, não residia tanto na reverência aos sacramentos quanto na utilidade que deles se podia extrair para os dramas contemporâneos. Por exemplo, ele validou as confissões dos padres da Fraternidade São Pio X — um gesto que, embora carregado de aparente misericórdia, gera algumas questões teológicas do tipo que fazem seminaristas suarem frio. Se a Fraternidade está em cisma, como muitos de seus defensores sugerem, então suas confissões não deveriam ter validade. E se as confissões foram validadas, talvez o cisma não seja tão cismático assim — ou então a teologia moral virou uma espécie de origami espiritual.

Outro caso emblemático é o da Sra. Nancy Pelosi. A congressista norte-americana, devota do aborto como se fosse um sacramental moderno, foi proibida de comungar por seu arcebispo, Dom Cordileone. Mas o Papa, em vez de reforçar a sanção, criticou-a como “uso político” da Eucaristia — e recebeu Pelosi de braços abertos no Vaticano. E assim, em nome de evitar o uso político dos sacramentos, usou-se politicamente o sacramento.

Aqui, algo se inverteu: a consciência subjetiva foi posta como rainha, e a norma objetiva, como criada silenciosa. A moral foi dobrada à psicologia, e a Tradição, submetida a um novo Magistério — o da compaixão ambígua. Esta tornou-se um critério autônomo, e a coerência, um incômodo.

2. Documentos como Enigmas

O pontificado foi fértil em documentos — alguns doces como colinas de Assis, outros densos como os desertos de Qumran. Há quem os leia com entusiasmo, e há quem precise de exorcista e gramático. Os textos que mais marcaram este tempo não foram os que confirmaram a fé, mas os que exigiram novas comissões para explicar o que, segundo os Apóstolos, deveria ser claro como a luz da manhã.

Traditionis Custodes tratou a Missa dos séculos como se fosse um desvio disciplinar. Amoris Laetitia insinuou que há pecados com os quais Deus decidiu conviver. Fiducia Supplicans ofereceu bênçãos que não abençoam, para uniões que não se santificam. O Catecismo foi mudado para condenar o que antes era permitido, como a pena de morte. E a declaração de Abu Dhabi sugeriu que todas as religiões são dons de Deus — o que é, ao mesmo tempo, confortador e aterrador, pois significa que a Cruz de Cristo teria sido um mero gesto estético.

Havia ali uma nova linguagem. Não herética de forma, mas enigmática de substância. Uma linguagem que parecia saída de parábolas pós-modernas, onde ninguém é condenado, ninguém se converte, e ninguém mais sabe o que é pecado — mas todos são acolhidos, inclusive os erros.

3. Governo eclesial ou partido sinodal?

Francisco se notabilizou por promover maus amigos e afastar bons adversários. Nomeou bispos e cardeais de inclinação progressista com uma constância quase matemática. Um de seus últimos gestos foi promover Robert McElroy, conhecido por defender ideias bastante criativas sobre a ordenação feminina, ao arcebispado de Washington. Entre tantos nomes possíveis, escolheu exatamente aquele que faria a tradição suspirar — não de alegria, mas de susto.

Por outro lado, tratou com rigorosidade bispos ligados à liturgia tradicional ou a doutrinas “demasiado claras”. Fez do Instituto João Paulo II um campo de reeducação pastoral. Quando o aborto estava prestes a ser aprovado na Argentina, sua pátria natal, sua reação foi tão discreta quanto um suspiro num show de rock.

4. Sínodos Sem Fim e Fins Sem Sínodo

O pontificado foi marcado por reuniões — muitas, longas e ruidosas. Mas reuniões são o substituto moderno da ação. O Sínodo da Amazônia terminou em Pachamama. O da Sinodalidade, que ainda se desenrola, segue em curso como um rio que se recusa a encontrar o mar. Foi tão inovador que acolheu votos leigos — porque, afinal, ninguém melhor do que um sociólogo de ONG para orientar a Igreja Universal.

5. A Herança: Uma Igreja Polarizada

O fruto visível de tudo isso é a polarização. A Igreja, outrora dividida entre fiéis e pecadores, entre judeus e gentios, entre monges e bárbaros, agora se divide entre “francisquistas” e “tradicionalistas”. E o próximo Papa, seja ele um novo Leão, um novo Gregório ou apenas um novo João, já nascerá cercado por expectativas e rejeições. Não será recebido como pai universal, mas como herdeiro de uma guerra civil.

O Pe. Allan Victor Marandola exprimiu bem: o novo Papa será julgado antes mesmo de falar. E talvez este seja o maior legado de Francisco — não a misericórdia, mas a tensão. Não a inclusão, mas a ruptura. Um Papa que desejou ser ponte, mas foi, inadvertidamente, um divisor de águas.

Conclusão

O tempo do Papa Francisco passou — como todos passam. Seus gestos serão pesados. Seus escritos, debatidos. Suas decisões, revisadas. Mas a Igreja continuará, porque ela não repousa no carisma de um homem, mas no corpo místico de um Deus humanado.

Roguemos, pois, para que o próximo pontífice governe não com astúcia política, mas com sabedoria de profeta; que una os filhos dispersos, não por manobras sinodais, mas pela verdade que liberta.

"Santifica-os na verdade: a tua palavra é a verdade." (Jo 17,17)

Porque a Igreja, afinal, não foi feita para agradar os tempos. Foi feita para salvá-los.


quinta-feira, 1 de maio de 2025

Três urgências do próximo pontificado

O novo Papa — seja quem for, venha de onde vier, com os traços de Pedro ou os gestos de Apolo — terá diante de si não uma página em branco, mas uma folha manchada. Haverá feridas a suturar, pilares a restaurar e, sobretudo, a coragem de desagradar aos que vivem da paz dos compromissos ambíguos. Três tarefas se impõem com urgência: libertar o sagrado, anunciar o verdadeiro e purificar o governo.

1. Libertar o sagrado

Entre as dores do último pontificado, poucas foram tão agudas quanto o cativeiro imposto à Missa Tridentina. A ferida aberta pela sua restrição ainda sangra nos corações dos fiéis — não por rebeldia, mas por amor. A Missa Antiga não precisa ser tolerada como uma peça de museu; precisa ser libertada como um prisioneiro injustamente condenado. E não apenas por justiça à tradição, mas por misericórdia com a própria Missa Nova, hoje tão extraviada nos desertos do experimentalismo litúrgico que já não sabe se é sacrifício ou espetáculo.

É irônico — como quase tudo na história da Igreja — que a única Missa que nunca foi abolida de fato tenha sido a mais perseguida de direito. A sua libertação será o primeiro passo não de uma cruzada estética, mas de uma restauração espiritual.

2. Anunciar o verdadeiro

Confundiu-se, nos últimos anos, evangelização com entretenimento. Sorrisos simpáticos, abraços coletivos, freiras dançantes e padres performáticos. Evangelizar hoje foi rebaixado a um exercício de cordialidade afetiva. A Boa Nova virou um bom dia e o Anúncio um abraço. Evangelizar já não é anunciar o Reino. É organizar retiros com músicas de flauta doce, distribuir pulseirinhas coloridas e repetir que “Deus te ama” com a mesma voz que se usa para consolar um gatinho ferido. 

A ironia atinge seu cume quando os novos evangelistas — os mesmos que condenam com ardor qualquer forma de evangelização verdadeira como proselitismo — organizam simpósios inteiros para discutir como converter... sem converter. Eles dizem: “É preciso anunciar, mas sem impor; é necessário dialogar, mas sem convencer; é urgente evangelizar, mas sem usar palavras.”. E o novo evangelista, ao ver um pagão, não lhe pergunta se quer ser batizado, mas se gostaria de conversar sobre "experiências significativas". Ao que parece, o Espírito Santo se converteu ao estilo zen e agora trabalha com gestos interpretativos. E de repente se espera que o muçulmano, o ateu e o agnóstico descubram a divindade de Cristo pela temperatura do sorriso do padre. Mas o mundo não foi salvo por um gesto simbólico: foi salvo por uma pregação sangrenta.

Contra tudo isso, ressurge a figura do padre Federico Highton no Malawi.


Sem powerpoints, sem danças, sem comitê de acolhimento inter-religioso. Apenas o Evangelho, uma catequese de dez minutos e a pergunta mais subversiva da modernidade: “Queres ser batizado?” E diante do “sim”, os sacramentos. Nenhum formulário. Nenhum workshop. Nenhum cardeal dançante.

E, no entanto, São Pedro evangelizou assim. São Francisco Xavier evangelizou assim. E Cristo também.

3. Purificar o Governo

A Igreja sempre teve pecadores. Mas há um tipo de pecado que grita mais alto do que todos: a nomeação episcopal errada. Santo Afonso de Ligório — um moralista, não um influenciador — dizia que promover indignos ao episcopado e ao cardinalato é pecado mortal:

“É certo que de nenhum modo se eximem de pecado mortal os que promovem os menos dignos ao episcopado e ao cardinalato.” (Th. Moralis, Lib. III, a. II, q. 91)

E por quê? Porque os cargos eclesiásticos existem para o bem comum da Igreja, e não para as alianças políticas nem para a paz dos corruptos.

Mas a lógica recente foi a inversa: bons bispos e cardeais foram silenciados; os piores entre eles, promovidos com fanfarra.

O próximo Papa não reformará tudo — e nem precisa. Mas deve iniciar a correção. A paz confortável dos Tuchos, Martins, Roches e Hollerichs da vida precisa ser perturbada. 

Purificar a hierarquia é salvar as almas. Pois uma Igreja sem santos no altar terá demônios no púlpito.

Conclusão

Em suma, a Igreja não precisa de novidades: precisa de veracidade. Uma liturgia que santifica, uma pregação que converte, uma hierarquia que governa com retidão. São essas as três colunas que o próximo pontificado deve restaurar — e restaurar com zelo apostólico, não com prudência mundana.

Todo Católico é Tradicional? Só os que Tocaram a Tradição. Por que é Justo Ser Chamado Católico Tradicional.

Padres do Instituto Bom Pastor Os debates recentes em torno do Centro Dom Bosco, conquanto tenham lançado muitos à febre da intemperança, tê...