quinta-feira, 27 de fevereiro de 2025

Papa Francisco adoece. Qual deve ser a atitude do católico que se sente machucado pelo pontificado?


O Papa Francisco segue internado no hospital Gemelli de Roma há 14 dias. O quadro do pontífice, segundo os últimos boletins médicos, segue complexo e com prognóstico reservado, isto é, sem uma previsão clínica de melhora, embora o Santo Padre tenha apresentado uma leve melhora nos últimos dias.

Diante desse cenário, o Vaticano convocou vigílias de oração pela recuperação da saúde do pontífice e o mundo católico como um todo se levantou para rezar pela mesma intenção.

Contudo, é simplesmente um fato que o pontificado do Papa Francisco tem sido marcado como um dos mais polarizados da História. O pontífice é reconhecido como um dos grandes representantes do progressismo católico e diversas ações do seu pontificado foram marcadas por notáveis polêmicas. Enumeramos algumas: 

a) O desmantelamento da Pontifícia Academia para a Vida mediante a reforma de seu estatuto, incluindo nisso a retirada da declaração de fidelidade dos seus membros ao Magistério e admissão de membros abortistas;

b) A abertura de uma pastoral, em Amoris Laetitia, para promover a comunhão para casais em segunda união, revertendo a pastoral proposta pela Veritatis Splendor;

c) A reversão da doutrina da pena de morte;

d) A dolorosa e severa restrição da Missa Tridentina mediante a promulgação do motu proprio "Traditiones Custodes";

e) O sepultamento da "Reforma da Reforma" de Bento XVI;

f) A promoção do clero progressista, principalmente do lobby LGBT;

g) O reerguimento da Teologia da Libertação;

h) A permissão de benção de pares homossexuais em "Fiducians Supplicans";

i)  O partidarismo na punição de bispos e cardeais conservadores;

j) A ruptura com a venerável tradição do serviço do altar exclusivamente masculino;

k) Apoio a políticos abortistas e combate a políticos conservadores;

l) A declaração de que todas as religiões levam a Deus e que a pluralidade delas é um dom ou presente de Deus;

m) A declaração de desejo por um inferno vazio. 

 

A lista de controvérsias não é pequena e por tais razões muitos proeminentes católicos chegaram a aventar que estaríamos diante do pior pontificado da História. Durante o pontificado de Francisco, além de haver um grande decréscimo das vocações, verificamos notórios católicos, alguns deles heróis de guerra da apologética católica, cardeais, bispos, etc., adotarem uma postura crítica ao pontificado, tais como Scott Hahn, Phil Lawler, George Weigel, Ralph Martin, Edward Feser, Cardeal Sarah, Dom Athanasius Schneider, Cardeal Gerard Müller, Eric Sammons, Karl Keating, entre outros.

No atual pontificamos, verificamos como os grandes machucados pelo pontificado de Francisco os católicos tradicionais, que foram surpreendidos com a reversão do motu proprio Summorum Pontificum de Bento XVI pela Traditiones Custodes. Este documento foi particularmente doloroso, porque recolocou a Igreja em uma situação análoga aos anos 80, nos quais as missas tridentinas eram extremamente raras e o que restava ao católico era se contentar com a já controversa Missa Nova cheia de abusos litúrgicos. No entanto, além de tradicionalistas, muito católicos ratzengerianos e wojtylianos (George Weigel, por exemplo) também encontram-se entre os católicos ressentidos com o atual pontificado, dado que Francisco, infelizmente, tornou-se conhecido por reverter a obra de seus últimos dois predecessores, esta sempre muito marcada pela busca da correção dos excessos do Concílio e pela perseguição da reconciliação interna da Igreja.

Pois bem. Ao que parece o Papa Francisco chegou ao seu estado mais delicado de saúde de seu pontificado. Os médicos não excluem o risco de morte. Diante desse cenário, muitos católicos foram criticados por católicos progressistas por não estarem, neste momento, apresentando muita comoção pública pela recuperação física do pontífice. Michael Matt, por exemplo foi duramente criticado por Dave Armstrong por fazer a seguinte afirmação em seu em seu Instagram:

"Somos obrigados a orar por uma recuperação rápida e completa do Papa Francisco? Por que essa seria a santa vontade de Deus? Francisco tem 88 anos. Vamos orar para que ele se arrependa, tenha uma morte feliz e enfrente a eternidade nas boas graças de Deus, independentemente do que pensemos de seu pontificado."

Matt é um conhecido tradicionalista americano e ferrenho opositor do pontificado de Francisco. Nesta fala, Matt entende que não estamos obrigados a rezar pela recuperação da saúde do papa, mas apenas por sua conversão e boa eternidade com Deus. Dave julgou a fala de Matt como verdadeiramente desprezível, dando a entender que o desejo de todo católico deve ser o reestabelecimento da saúde do papa. 


Tradução:

"Reacionário Michael Matt (do infame "Remnant"): Não estamos obrigados a rezar pela recuperação do Papa, mas sim por seu arrependimento!

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"Somos obrigados a orar por uma recuperação rápida e completa do Papa Francisco? Por que essa seria a santa vontade de Deus? Francisco tem 88 anos. Vamos orar para que ele se arrependa, tenha uma morte feliz e enfrente a eternidade nas boas graças de Deus, independentemente do que pensemos de seu pontificado." [20-2-25 em seu trapo vergonhoso]

Efésios 6:18 (RSV) "Orem em todo o tempo no Espírito, com toda oração e súplica. Para esse fim, mantenham-se alertas com toda a perseverança, fazendo súplicas por todos os santos."

Tenho alertado as pessoas sobre o Remnant e outros grupos reacionários desse tipo durante os 28 anos desde que tenho um site/blog. Há mil boas RAZÕES para isso: uma delas é evidente nas opiniões e no comportamento desprezíveis de Matt."

Não compartilhamos de muitas das opiniões de Michael Matt e não entendemos como razoável a sua postura muitas vezes acintosa contra o Santo Padre. Devemos sempre ter em mente que o Sumo Pontífice, como ensina o Pe. William Faber em "Da Devoção ao Papa", é realmente uma pessoa venerável, razão pela qual devemos ter verdadeira piedade filial, independente de quem seja. Não é admissível a um cristão zombar ou desprezar o Sumo Pontífice. Não é possível, por isso mesmo, nutrir ódio de inimizade, pelo qual se deseja o mal enquanto tal ao próximo, contra o Santo Padre.

No entanto, devemos nos perguntar: Michael Matt mentiu? Católicos que foram feridos por este pontificado estão realmente obrigados a desejar e rezar pela pronta recuperação do Papa? É o que iremos descobrir.

Para tanto façamos um digressão sobre (i) como se compreende o ódio e a caridade pelos inimigos e (ii) se um papa pode ser o nosso inimigo.


O ódio e o amor pelos inimigos

Santo Afonso de Ligório ao tratar do ódio e do amor aos inimigos em sua Teologia Moral distingue o ódio de inimizade do ódio de abominação:

"Embora seja pecado mortal ex genere suo o ódio de inimizade, ou seja, à pessoa secundum se e aos bens que em si possui, desejando-lhe mal por mal, ou na medida em que é mal para ela; contudo muitas vezes é lícito o ódio de abominação, ou seja, de qualidade, com o qual aborrecemos não o homem, mas sua malícia, ou a pessoa em quanto é má, ou prejudicial a nós, como ensina Coninck e as opinião comum."

E complementa:

"É lícito desejar mal ao próximo, por exemplo, temporal (desde que não seja mais grave que justo), em quanto é para ele um bem, por exemplo, doença ou adversidade, para que se emende dos seus pecados. Bonacina", com funda-mento em muitos. Mas é preciso prevenir que não seja feito por vingança, com que pecas mortalmente, conforme se pode ler no Salmo 108 sobre o inimigo. Porém, em geral, é lícito desejar a outras pessoas, com afeto ineficaz, males de pena por causa do bem espiritual próprio ou alheio: porque, como nesse afeto se antepõe o bem espiritual ao temporal, não é desordenado. Veja-se Lessius. - [Veja o que será dito no Liv. V, n. 21].

<<Assim, é lícito, por exemplo, desejar a morte ao heresiarca ou ao perturbador da paz pública, por causa do bem comum e de muitos; conforme o passo de Gálatas 5, 12: Oxalá fossem cortados. Também é lícito entristecer-se com as dignidades concedidas aos indignos, ou com a saúde de quem dela se vale para pecar. Igualmente é lícito desejar a alguém a morte, pobreza ou doença, para que abandone o pecado e mude de vida. Pela mesma razão, Bonacina, Azor e Palao escusam de pecado a mãe que deseja a morte das filhas, quando, por alguma deformidade ou penúria, não lhes pode arranjar núpcias por meios honestos e cômodos». [Isto porém não se deve admitir de jeito nenhum; como dizem acertadamente os Salmanticenses e Roncaglia)"

Segundo padroeiro dos confessores e moralistas, o ódio de inimizade é aquele em que odiamos a pessoa em si mesma e desejamos a ela o mal pelo mal, isto é, como um ato de vingança. Já no ódio de abominação se detesta não a pessoa, mas a sua malícia, os seus pecados ou o mal que faz a nós. O ódio de inimizade é proibido nutrirmos contra qualquer pessoa, inimiga ou não, porque somos obrigados por dever de caridade a desejar a salvação do próximo. Desejar o mal gratuito ao inimigo significaria um ódio à criação de Deus e à bondade que ele inscreveu nas criaturas. Assim, odiar uma pessoa é o odiar o próprio Deus. O ódio de abominação, porém, é lícito termos, desde que não odiemos a pessoa em si mesma, e poderíamos inclusive desejar um mal temporal, mesmo a morte, para um inimigo visando o bem moral dele, isto é, a sua conversão e mudança de vida, ou o bem comum. Inclusíve é lícito nos entristecermos com a saúde de quem dela se utiliza mal.

O mesmo entendimento é seguido por outros moralistas. Antonio Royo Marín, em sua "Teologia Moral para Leigos", assim ensina:

"Já falamos dele ao expor a doutrina sobre o perdão aos inimigos. Aqui nos limitamos a recordar alguns princípios fundamentais.

1.º) O ÓDIO DE INIMIZADE (pelo qual se deseja ao próximo algum mal enquanto tal, ou se tem alegria por seus males, ou tristeza por seus bens) opõe-se diretamente à caridade (amor de benevolência) e é em si pecado mortal, a não ser por pequenez de matéria ou imperfeição do ato. Consta expressamente na Sagrada Escritura (1Jo 2, 9; 3, 14-15; 4, 20, etc.) e pelo fato de que o próximo, ainda que seja mau e pecador, foi redimido por Cristo, é membro do Corpo místico de Cristo (em ato ou em potencia) e está destinado à vida que são outros tantos motivos de caridade.

2.º) O ÓDIO DE ABOMINAÇÃO (que recai sobre o próximo enquanto pecador, perseguidor da Igreja, ou pelo mal que nos causa injustamente) pode ser reto e legítimo caso se deteste não a pessoa mesma do próximo, mas o que há de mau nela; porém, caso seja odiada pelo que há nela de bom ou pelo mal que nos causa justamente (v.g., o juiz, o superior, etc., castigando legitimamente o delinquente), opõe-se à caridade (amor de concupiscência) e é pecado em si grave, a não ser por pequenez de matéria ou por imperfeição do ato.

3.º) Não há pecado algum em desejar ao próximo algum mal fisico, mas sob a razão de bem moral (v.g., uma enfermidade para que se arrependa sua má vida). Tampouco o seria alegrar-se com a morte do próximo que propagava erros ou heresias, perseguia a Igreja, etc., contanto que este gozo não redunde em ódio para com a própria pessoa que causava aquele mal. A razão é que odiar o que em si é odioso não é nenhum pecado, mas totalmente obrigatório quando se odeia segundo a reta ordem da razão e da maneira e com a finalidade devidas. Não obstante, é preciso estar muito alerta para não passar do ódio de legítima abominação do mal ao ódio de inimizade para com a pessoa culpada, o que nunca é lícito, ainda que se trate de um grande pecador, já que ainda está em tempo de se arrepender e se salvar. Somente os demônios e os condenados do inferno se tornaram definitivamente indignos de todo ato de caridade em qualquer de suas manifestações." (n. 538)

Antonio Arregui em "Summarium Theologiae Moralis" igualmente diz:

"Nem todos os penitentes que se acusam de ódio são imediatamente acusados ​​de pecado grave; pois muitas vezes confundem o ódio da inimizade, que é exercido contra uma pessoa em si mesma e dos bens que ela possui, com o ódio da abominação, que é exercido contra suas más qualidades, ou sobre uma pessoa considerada prejudicial para nós, ou com uma aversão natural e invencível que não é má em si." (n. 140)

Portanto, não é contrário ao preceito de amarmos os nossos inimigos o ódio de abominação e o desejo de certos males para sua correção ou para o bem comum. Com isto estabelecido, abordaremos agora se é possível existir ódio de abominação contra um papa.


Os maus papas e o ódio de abominação

Não há qualquer dúvida razoável de que maus papas existiram. Até mesmo o mais ferrenho dos continuístas é capaz de reconhecer esta verdade. Na História da Igreja já se viu papas sodomitas, assassinos, estupradores, fornicadores e favorecedores de heresia. Alguns desses Papas foram publicamente defenestrados pela Igreja Romana, sendo o maior exemplo o Papa Honório. Honório, independente se ensinou heresia ou não, não tem boa memória perante a Igreja e é contado entre os anematizados por ela.

Com efeito, é possível afirmarmos que, sim, um papa pode ser tanto inimigo pessoal de um indivíduo, já que é capaz de pecados mortais contra a vida, o matrimônio, o patrimônio de alguém, etc., quanto um inimigo da Igreja, na medida em que diz heresias (Se um Papa pode ser herege é disputado entre os teólogos) ou que as favorece (não é disputável se um Papa pode favorecer heresias, pois a Igreja confirmou que Honório fez isso).

Sendo assim, é igualmente possível existir ódio de abominação a um pontífice.

Nesse contexto, é simplesmente um fato que o pontificado de Francisco machucou muitos católicos. Papa Francisco tomou decisões impopulares que geraram (e ainda geraram) uma onda de desconfiança e até de profundo ressentimento contra o Sumo Pontífice. Lembremos que a Traditiones Custodes dizimou comunidades inteiras e frutuosas de católicos ligados à Missa Tridentina. Uma ação pastoral dessas dificilmente não poderia ser enquadrada como um pecado contra caridade. Mesmo um católico progressista como Karl Rahner reconhecia que o Papa que pretendesse extinguir um rito tradicional cometeria uma falta gravíssima contra a caridade e a unidade da Igreja:

"Imagine que o Papa, como pastor supremo da Igreja, emitiu hoje um decreto exigindo que todas as igrejas unidas do Oriente abandonassem a sua liturgia oriental e adoptassem o rito latino... O Papa não excederia a competência do seu primado jurisdicional e o decreto seria legalmente válido.

Mas também podemos colocar uma questão totalmente diferente. Seria moralmente lícito que o Papa emitisse tal decreto? Qualquer homem razoável e qualquer cristão verdadeiro teria de responder “não”. Qualquer confessor do Papa teria de lhe dizer que na situação concreta da Igreja hoje tal decreto, apesar da sua validade jurídica, seria subjetiva e objetivamente uma ofensa moral gravíssima contra a caridade, contra a unidade da Igreja bem entendida (que não exige uniformidade), contra a possível reunião dos Ortodoxos com a Igreja Católica Romana, etc., um pecado mortal do qual o Papa só poderia ser absolvido se revogasse o decreto." (Studies in Modern Theology de Karl Rahner (Herder, 1965, pp. 394-395)

Pe. Chad Ripperger igualmente afirma em seu livro "The Binding Force of Tradition" que o ataque aos monumentos da Tradição, nos quais os ritos tradicionais se inserem, é um pecado, podendo ser até mesmo grave, contra a caridade:

"Se alguém ama o próximo, desejará garantir que o próximo receba a tradição tão plenamente quanto possível para o bem da sua salvação. As extensas mudanças recentes na tradição tornaram mais difícil a salvação das nossas almas, o que é contra a caridade. O assalto aos monumentos, bem como a clareza doutrinária sobre a fé e a moral ensinada pela Igreja, devastou os afetos que as pessoas têm pelas coisas da fé e às quais estão apegadas de uma forma devidamente ordenada. O impacto que teve nas pessoas é claramente contra a caridade e não pode ser interpretado de outra forma que não seja pecaminoso, muitas vezes gravemente pecaminoso, especialmente quando falamos do desprezo com que estas coisas foram mudadas, bem como do desprezo demonstrado por aqueles que foram atados a elas de maneira corretamente ordenada."

Papa Francisco, ademais, foi um tanto controverso nesta decisão, tendo em vista que revogou inteiramente a legislação de um predecessor ainda vivo, Bento XVI, colocando em risco a credibilidade das decisões da Igreja.

Além disso, as declarações polêmicas tais como "Gosto de pensar em um inferno vazio", "A pluralidade das religiões é um dom de Deus", "A pena de morte é inadmissível para além de toda circunstância" são tão ou mais problemáticas que o ensino dúbio de Honório.

Por tais motivos, é totalmente compreensível que alguns católicos se sintam verdadeiramente feridos e ressentidos com Francisco e não nutram agora afetos especiais de amizade, não fiquem entristecidos com sua enfermidade e nem façam comoção pública pela sua rápida recuperação.

Estes sentimentos e esta atitude desses católicos não são censuráveis, se não forem movidos por ódio de inimizade, mas unicamente pelo desejo de que os males temporais ajudem o Papa a mudar os rumos do pontificado ou a conquistar a vida eterna (opinião de Michael Matt) ou ainda para ver o fim de um governo especialmente doloroso.

É preciso dizer que Deus exige de nós uma caridade sobrenatural para com o próximo, mas não exige, absolutamente, uma caridade repulsiva à natureza ou contrária ao bem comum. Em outras palavras, Deus quer que conservemos em absoluto o desejo de salvação do próximo, porém não exige que desejemos ao próximo a preservação de todo mal. Alguns males temporais, em certas circunstâncias, são medicinais para ele. Desejar ao próximo todo bem possível e imaginável não seria nem mesmo reto em algumas ocasiões, especialmente naquelas em que a justiça precisa seguir seu curso.

Pois bem. O que esses católicos machucados pelo pontificado podem fazer então? As opções são diversas. Eles podem:

1. Rezar pela recuperação do Papa, para que não venha um papa pior. Esta posição é uma das sugestões indicadas por Santo Tomás de Aquino em "De Regno":

"Verdadeiramente, costuma acontecer, na tirania, tornar-se a posterior mais grave que a precedente, pois não retira os gravames anteriores e, até, pela perversidade do coração, excogita novos. Por essa razão (Valério Máximo, Memorabilia, VI, 2, ext. 2), como outrora, em Siracusa, todos desejassem a morte de Dionísio, certa velha orava continuamente a fim de que ele ficasse incólume e sobrevivesse a ela. Disso sabendo, interrogou o tirano por que fazia assim. Ao que respondeu: “Quando eu era menina, como tivéssemos pesado tirano, desejava a morte dele; morto esse, sucedeu-lhe outro algo mais rude, cujo fim de dominação eu tinha por grande bem. E começamos a ter um governo mais intolerável, que és tu. Portanto, se fores derrubado, sucederá um pior no teu lugar”." (Cap. VII)

2. Rezar pela recuperação do Papa, mas pedindo que ele se torne santo ou mude os rumos do pontificado. Nesse sentido, pode-se rezar a prece "Oremus Pro Pontifice Nostro" que pede a Deus que vivifique o Papa e lhe dê santidade de vida na Terra.

℣.Oremus pro Pontifice nostro NN.

℟. Dominus conservet eum, et vivificet eum, et beatum faciat eum in terra, et non tradat eum in animam inimicorum eius.

℣. Tu es Petrus,

℟. Et super hanc petram aedificabo Ecclesiam meam.

Oremus.

Deus, omnium fidelium pastor et rector, famulum tuum NN, quem pastorem Ecclesiae tuae praeesse voluisti, propitius respice: da ei, quaesumus, verbo et exemplo, quibus praeest, proficere: ut ad vitam, una cum grege sibi credito, perveniat sempiternam. 

Per Christum, Dominum nostrum. 

℟. Amen.

3. Rezar para que a doença enfrentada pelo Papa o ajude a se santificar.

4. Rezar para que, se o destino do Papa for o pior, que ele descanse em amizade com Deus. Esta é a posição de Michael Matt.

5. Rezar para que, se o Papa falecer, ele descanse em amizade com Deus e que o seu sucessor seja um bom papa. Esta parece ser a posição de Timothy Gordon:



6. Rezar para que Deus exerça seu juízo e vontade sobre o pontífice poderando, na oração, as dificuldades do pontificado.

Todas essas atitudes não contrariam a devida piedade filial ao Papa e o amor aos inimigos. Em nenhuma dessas hipóteses se deseja o mal em si do Pontífice, mas somente o bem dele ou da Igreja nas condições pontuadas pelos teólogos.

Dito isso, rezemos pelo Papa Francisco para que Deus exerça sua soberana vontade em todas as coisas e que o Papa, quer nesta vida ou na outra, seja um grande amigo de Deus.

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2025

Rejeito a Carona (Augusto Pola Junior)


Um amigo perguntou-me se eu iria falar da questão da “conversão” de Pedro Affonseca, ex-presidente do Centro Dom Bosco (CDB) que recentemente fez um “mea culpa” em favor de uma, digamos, vida paroquial mais pacífica. Respondi que não tinha interesse, pois o drama da Igreja pós-conciliar, cujos maus frutos são vistos nas paróquias, e cuja esperança de mudança não são vistas no horizonte quando se está dentro desses muros oficialistas, é realmente causador de dissonâncias cognitivas grandes. Diante da visão tradicional em contraste com os hábitos paroquiais, na impossibilidade de haver harmonia entre ambos, não cabe a mim ser fiscal de sua consciência. Se ele acha que seu tesouro está na paróquia e quer vender todos os bens para estar nesse terreno, que seja.

Em vídeos anteriores, ainda na época de CDB, Pedro Affonseca tinha dito que era continuísta, mas depois, estudando a crise, passou a ser tradicionalista, embora sem querer moralizar os continuístas, respeitando-os. Recentemente se retratou desta sua postura anterior, optando por “ficar em harmonia com a hierarquia da Igreja”, concretamente em sua paróquia. Ok. Minha opinião sobre isso nem é capaz de mudar sua situação, nem é importante. O máximo que fiz foi, no privado com alguns amigos, compartilhar algumas análises de conjunturas e fazer algumas ironias sobre a situação precária da Igreja. É que a repercussão sobre o vídeo do Pedro não é uma causa, mas o efeito de um estado de coisas. Estou mais interessado neste âmbito.

Mas isso é como eu decidi agir diante deste caso. Diferentemente é a mentalidade do influencer que precisa usar o caso para seu benefício. É o que fez o Santa Carona, que em seu Instagram montou todo um carrossel de textos e imagens que vamos analisar. Novamente, não estou interessado no Pedro (como ironizei em meu Facebook, sua retratação em nada impacta a indústria de anime, então, segundo este critério, não é importante), mas no âmbito mais psicológico-sociológico e, por que não, teológico (quando aplicável).


Mas que raio de título é esse? Tentação de Sempre? Até onde sei, a tentação de sempre é o “SEREIS COMO DEUSES”, ou seja, o pensamento que, uma vez consentido, causou o Pecado Original. O que isso tem a ver com uma posição diante da crise? Embora possa haver soberba em torno do debate acerca da crise da Igreja, tal vício capital não é exclusividade de uma só corrente. Todos – tradicionalistas, carismáticos, tradismáticos, continuístas, libertários, etc. – podem ter sua posição tanto por soberba (para querer se sentir superior aos outros ou para que suas próprias idiossincrasias estejam acima do bem e da verdade) quanto por humildade (de tudo que sabe e estudou, tem esse opinião).

Este título carrega consigo não só aquele sensacionalismo de que os influencers adoram (ditadura do like, como criticam corretamente os libertários, ainda que por motivos errados), mas também uma sugestão perniciosa, a saber, que a posição tradicionalista é fruto de uma tentação (a de sempre) enquanto que a posição continuísta estaria livre, não em potência, mas em ato, desta tentação.

Ainda bem que se trata de uma carona. Se fosse taxista, só pelo título já suspeitaria de que estaria trapaceando no taxímetro.


Claro, parou.




Parece que sentiu peso na consciência por criticar a hierarquia. Bom, isso é problema dele. Como não estou interessado no Pedro, mas na análise influencerística do Santa Carona, sigamos.





Zelo pelo sagrado é uma virtude. O problema dos zelotas é que trocaram o zelo religioso pela ambição política. O religioso deveria servir aos fins políticos, o que é obviamente uma inversão, o correto é que o poder temporal seja submisso ao poder religioso. Os zelotas inverteram os princípios. Neste sentido, descendente dos zelotas, hoje, seriam os teólogos da libertação ou, em sinal oposto a estes, os conservadores-direitistas, muito afoitos às narrativas ideológicas da política atual, não os tradicionalistas, que por princípio militam pelo Reinado Social de Cristo.

Aliás, o zelo, como dito, é uma virtude, muito em falta em nossos dias. Pecam terrivelmente pela falta de zelo, por exemplo, os laxistas, dentre os quais muito são conservadores-continuístas. É um zelo a mulher usar véu em lugar sagrado, ratificado perenemente por nada mais nada menos que São Paulo, mas os continuístas acham estranho usar véu. É um zelo comungar na boca e de joelhos, mas a maioria dos católicos não o fazem, apegando-se ao argumento do “direito” sobre a piedade. É um zelo o canto gregoriano na Missa, mas os continuístas não fazem questão de militar pela qualidade da música litúrgica… E assim poderíamos seguir passando por vários tópicos. O que quero mostrar é que essa falta de zelo é sempre em favor dos costumes do mundo contra o costumes tradicionais da Igreja (nem vou adentrar na questão doutrinal que fundamentam tais práticas, coloquemos em termo de costume, do jeito que o conservador gosta). Sendo assim, quem é mais zelota, espiritualmente falando, os tradicionalistas ou os continuístas, sobretudo em seu subgrupo laxistas?


As consequências do pensamento zelota não podem deixar de ser catastróficas, pois é a inversão da ordem que coloca o religioso a serviço de objetivos políticos.

Agora, o que isso tem a ver com os tradicionalistas? Estes não têm nem estão lutando pelo poder político. Quanto ao poder eclesiástico, eles são perseguidos. Por mais que se diga que se deva acolher a “todos, todos e todos”, sabe-se que, na prática, os tradicionalistas não são bem-vindos nas paróquias. Ademais, são, segundo a quantidade, minoritários. Tudo o que os tradicionalistas têm é a defesa de um conjunto de teses críticas ao Concílio Vaticano II, argumentando que dito Concílio rompeu com a ortodoxia da fé. Ou seja, o âmbito de influencia das correntes tradicionalistas é o campo cultural, sem influência sobre o poder eclesiástico vigente.

O tradicionalismo cresce “por fora” da Igreja, porque “por dentro” são perseguidos.


A preocupação dos zelotas era terrena. Quem se enquadraria melhor na descrição de “zelo exacerbado e desordenado pelo Templo” é o fariseu, justamente quem mandava no templo, quem detinha o poder espiritual. E precisamente porque não queriam que alguém reinasse acima deles no Templo, mataram o próprio Deus.

Toda uma bizarra analogia com os zelotas para chegar no grosseiro sofisma de que a culpa é do mensageiro?

Se as coisas estão ruins, a culpa não é do reformador e de quem detém o poder da ação concreta, mas de quem denuncia os maus frutos?

Malvados “zelotas” que falam o que estão vendo. Seria melhor que fizesse como o avestruz, que enterra a cabeça na terra para não ver.

forma mentis do Carona lembra-me uma passagem que escrevi na Apresentação da edição que fizemos das obras morais e pastorais de Santo Agostinho:

"Havia na época de Santo Agostinho os hereges priscilianistas que, além de muitas heresias doutrinais, defendiam um método de atuação a partir de um pensamento permissivo à mentira: “pode-se mentir para converter o próximo à nossa religião”. Por conta disso, eles fingiam ser católicos para, quando tivessem oportunidade, convencer os católicos a apostasiarem em favor da heresia de Prisciliano. Consêncio está preocupado com a refutação das heresias, e nisto foi elogiado pelo Doutor da Igreja, e com o desmascaramento dos hereges que se fingem de católicos para enganar os católicos. Neste ponto, consulta Santo Agostinho para saber se seria uma boa ideia imitar o método priscilianista “para o bem”, ou seja, mentir para fazer-se passar por priscilianista a fim de os converter à fé católica, isto é, à Verdade, ou pelo menos, quando isso não fosse possível, os descobrir para que não mais pudessem mais atuar a modo de espião no meio católico.

Eis uma obra obrigatória [A obra Contra a Mentira] para qualquer teólogo pastoralista moderno, incluindo também os defensores do ecumenismo irenista moderno, cuja abordagem pastoral se tornou hegemônica no período após o Concílio Vaticano II. Descobrirão que Santo Agostinho já refutava e previa o fracasso de seus intentos pastoralistas, pois, em relação ao que praticam hoje, no que diferem em essência do método priscilianista?

Em nome de um diálogo ecumênico, por exemplo, os católicos não devem fingir que a devoção aos Santos e a Nossa Senhora não são, assim, tão importantes? Não cedem os bispos as suas igrejas para serem sacrilegamente profanadas pelos cultos de falsas religiões? Não são marginalizados os católicos polemistas, porque supostamente estariam atrapalhando a pastoral da igreja com seus discursos dito rígidos? Na conversão dos próprios jovens, não omitem os padres aqueles preceitos doutrinais que mais contrastam contra o mundo moderno, principalmente os de modéstia e castidade, porque isso supostamente os entristeceria de praticar a religião? E o que dizer dos casados? Estaria a castidade conjugal fora de moda? E para que combater o feminismo em favor dos conselhos do Apóstolo Paulo aos Efésios, se em nome da “adaptação para conversão” a Igreja pode incentivar disciplinas feministas, até chegar ao ponto de aceitar que acessem a Sagrada Comunhão os adúlteros recasados? E o termo empregado para permitir esses e outros desvios escandalosos não é o tal do “discernimento pastoral”?"

Em nada ficaria surpreso Santo Agostinho em ver que, diante de tal pastoral enlouquecida, ou mais precisamente, mentirosa, pois não são estas as práticas que a Igreja crê e defende, mesmo os católicos supostamente convertidos seriam mais mundanos do que católicos, uma espécie de pagão batizado:

Ficaria, pois, muito claro que não hesitamos em condenar, com toda a sinceridade de nossa piedade, os perversos erros da heresia priscilianista acerca de Deus, da alma, do corpo e de outros temas; porém, no que se refere a mentir para ocultar a verdade, admitiríamos (Deus nos livre!) um dogma comum com eles? Ora, este é um mal tão grande, que mesmo se nosso empenho de os capturar e os mudar por meio da mentira prosperasse, de modo que fossem conquistados e mudados, nenhum ganho compensaria o dano que resultou disso: nós mesmos nos corrompemos ao buscar sua correção. De fato, ao utilizar este embuste, perverteríamos a nós mesmos em parte, e eles seriam corrigidos pela metade, visto que não corrigiríamos neles a opinião errônea de que se pode mentir em prol da verdade, pois seria o que lhes ensinaríamos e lhes mandaríamos pôr em prática a fim de poder capturá-los. E assim, não os emendaríamos ao não lhes arrancar essa patranha pela qual creem que se possa camuflar a verdade, e, além disso, enganaríamos a nós mesmos ao lhes buscar por meio dessa falsidade. Ademais, nunca poderemos saber a sinceridade da conversão daqueles aos quais mentimos quando estavam na perversão, pois provavelmente farão, uma vez capturados, o que fizemos para capturá-los, e não só porque estavam acostumados a fazê-lo, mas também porque encontraram o mesmo comportamento conosco” (Santo Agostinho, Contra a Mentira, 6)

Em essência, a pastoral moderna, que é permissiva com os pecados do mundo, e, por isso, favorece a corrupção dos costumes, junto com seu ecumenismo moderno, que pratica o relativismo religioso e favorece a difusão de heresias e erros doutrinais, já nasceram para fracassar. Não tinha como dar certo."

É verdade que Santa Carona não chega ao absurdo de propor a mentira, mas a simples omissão para “não expor” as fragilidades. Todavia, tais fragilidades são fruto de má doutrina e, portanto, expô-las não é zelo excessivo, mas zelo.

Estão errados os tradicionalistas em seus argumentos? Denunciam erros que não são erros? Que sejam refutados ou contrapostos. Rotulá-los de “zelotas”, porém, é desonesto.

O problema é que fazer isso significa adentrar no mérito de questões sensíveis. E para o Santa Carona, fazer isso não é zelo, mas “expor a fragilidade da Igreja”, como se a Igreja estivesse fragilizada por causa de seus críticos, e não por causa de heresias que obscurecem a sua pureza doutrinal…

É arriscado pegar carona com esse tipo de miopia.


Também não me espanta, ainda que por motivos diferentes do Carona. De fato, a dinâmica hodierna das paróquias modernas não são harmonizáveis com o conhecimento da Crise da Igreja à luz da Tradição. É um contraste muito grande que vai desde a música litúrgica (normalização do violão) até conteúdo catequético.


Novamente demonstração da miopia do Carona. Mas antes, vamos colocar um pingo no "i".

É um elemento desonesto da retórica na internet chamar de ataque o que é crítica. Santa Carona faz isso. Espero que o faça por vício inconsciente de influencers, que por usar muito a internet acaba pegando, sem notar, muitos cacoetes. Mas ataque é diferente de crítica. Quem ataca a Igreja é, doutrinalmente, a heresia, e, moralmente, os pecados públicos, que, por causa de seu mau exemplo, induzindo outros ao pecado e ao erro, se chamam escândalos.

Quem refuta uma heresia ou critica escândalos pratica um ato de zelo, na esteia de como disse Santo Agostinho: “Ficaria, pois, muito claro que não hesitamos em condenar, com toda a sinceridade de nossa piedade, os perversos erros da heresia“.

Os apostolados tradicionais não são um tabloide ou mídia de fofoca, senão que seus discursos, em sua atuação polêmica-intraeclesiástica – versam sobre a crise e/ou sobre os efeitos gerados por ela.

Ademais, os escândalos e heresias são tanto mais graves quanto mais alta é a hierarquia de quem cai neles. Assim, por ser maior os escândalos causados por prelados, maior a necessidade de corrigi-lo, sob risco de outras almas – sobretudo as sem instrução – perecerem juntas.


Outros artigos [aqui e aqui] já lidaram recentemente sobre essa questão do tradicionalista e a vida paroquial. Mas volto a repetir: Se a vida paroquial é nociva ao progresso espiritual [por causa do tal aggiornamento pós-conciliar que impregnou na pastoralidade moderna], é prudente o afastamento (que não necessariamente significa isolamento).

Sobre “se refugiar em centros ideológicos”, aqui já saímos da miopia para adentrar na absurdidade.

O “Maledicente Carona” sugere que a vida paroquial não é ideológica enquanto que os centros – associações civis criadas por católicos – o são. Primeiramente, não é porque uma associação de leigos católicos não está sob jurisdição paroquial que ela é ideológica. Segundo, sobre ideologia nas paróquias, basta voltar ao que escrevi na Apresentação que reuniu algumas obras de Santo Agostinho.

A coisa é absurda, porque é uma completa inversão. Centros como o Dom Bosco buscam ter uma forte base tomista, cuja característica é não ser ideológica. As paróquias, em geral, estão mais ou menos contaminadas por uma corrente teológico-ideológica chamada “Nova Teologia”.

Ok, talvez eu esteja sendo injusto com o Santa Carona. Ele toma paróquia em seu sentido ideal, que significa “estabelecimento no estrangeiro”. Seria o local onde os leigos, após seu período de trabalho no mundo, mas não sendo do mundo, iriam para poder estar em casa, ou seja, seguros quanto aos ensinos e atividades, todos eles iluminados pela fé e aquecidos pela caridade.

Ó Carona, pretensamente Santa, que imagem fazes da paróquia? Medita, recomendo, a passagem de São Lucas 18,1: “Acaso quando o filho homem voltar achará a fé na terra?”. Medita o que o Catecismo atual da Igreja (não vou recomendar o Catecismo Romano de Trento, para não soar ideológico) em seu n. 675: “Antes da vinda de Cristo, a Igreja deverá passar por uma prova final, que abalará a fé de numerosos crentes. A perseguição, que acompanha a sua peregrinação na Terra, porá a descoberto o «mistério da iniquidade», sob a forma duma impostura religiosa, que trará aos homens uma solução aparente para os seus problemas, à custa da apostasia da verdade. A suprema impostura religiosa é a do Anticristo, isto é, dum pseudo-messianismo em que o homem se glorifica a si mesmo, substituindo-se a Deus e ao Messias Encarnado“.

Medita e depois responde: Estão as paróquias blindadas da impostura religiosa? Coloque os óculos para não ver miopemente, e responde: A substituição do canto gregoriano por ritmos mais sentimentais, o padre rezando de frente ao povo, o leigo leitor em substituição às ordens menores, o não-uso do véu, a comunhão na mão, a imodéstia feminina, o dialoguismo, a escassez de parresia, etc., está mais próximo do homem que glorifica a Deus ou do homem que glorifica a si mesmo?

Responde Carona, quem é o responsável por esse estado de coisas? Todo esse turbilhão humanista (humanismo será a religião do Anticristo, isto é, o homem que se glorifica a si mesmo) propicia ou atrapalha o progresso na santidade?

Não é na Eucaristia onde mais gloriamos a Deus? Então por que a liturgia é onde a coisa está mais avacalhada? Por que é tão difícil achar um lugar onde a Adoração Eucarística seja feita de maneira recolhida, sem o barulho dos instrumentos e dos ritmos mundanos?

A realidade paroquial está ruim. E o que você faz? Culpa quem é vítima desse estado de coisas!

Honestamente, quem tu achas que causa mais mal do que bem às almas sem instrução, quem denuncia esse estado de coisas, mostrando que há uma riqueza que as próprias autoridades atuais estão escondendo, ou quem, devendo instruir as almas na ortodoxia da Fé, não só não o faz, como ainda o faz ensinando ao modo hegemônico, isto é, humanista?

Carona, para que a Igreja não fosse considerada machista, mudaram a tradução de São Paulo! Não é mais submissão (sede submissas a seus maridos), mas solicitude (sede solícitas). Isto é lido em plena missa, em determinado domingo!

Continuas tankando o que sugeriste? Não há ideologia nas paróquias?

É verdade que dirás, mais a frente, que há muito modernismo nas paróquias. Mas por que deixar vago demais? Por que, não mais sendo míope, mas se cegando, criticas aqueles que com palavras condenam os erros que a hierarquia pratica com ação?


Só pode haver comunhão na verdade. Na Igreja, a comunhão significa, efetivamente, concórdia na Fé. Ou seja, além do batismo (que nos dá a vida sobrenatural) é necessário a integridade da fé.

Aqui evidenciamos novamente a miopia de Carona. Ele inverteu a lógica. diz que “a fé católica só está verdadeiramente viva quando há comunhão com a Igreja”, quando na realidade só há comunhão com a Igreja quando a fé católica está verdadeiramente viva.

A régua não é a comunhão, mas a ortodoxia da fé. Xô fraternidade humanista!

Assim, quando o Papa Francisco mina a ortodoxia, gera escândalo. E criticar – filialmente, claro – o escândalo não será “ferir” a comunhão ou “expor fragilidade”, mas zelo.

forma mentis continuísta é uma bagunça mesmo.

Ele admite, corretamente, uma heresia em roga: o modernismo. Admite que o modernismo é canal para perdição das almas. Admite que invadiu as paróquias. MAS AÍ DE TI SE NÃO FREQUENTAR AS PARÓQUIAS E TENTAR FAZER APOSTOLADO PRESCINDINDO DELAS! Acima de tudo, é preciso a comunhão, embora a heresia não seja fonte de comunhão. Mas estar em comunhão é estar próximo da heresia, de outro modo, seria melhor afastar-se da vida paroquial. Mas se afastar da vida paroquial é não querer pagar o preço da comunhão. E o preço da comunhão é uma vida lado a lado com a heresia, em pleno ambiente paroquial, que é fonte de descomunhão.

Parece contraditório. Mas só o é do ponto de vista Tradicional. Do ponto de vista humanista, é perfeitamente possível conciliar esse estado de coisas. Basta colocar a “paz com o irmão” acima da ortodoxia da fé, e chamar isso de caridade ou prudência. Aos críticos desse estado de coisa – desse “fingimento pastoral-paroquial”, de fingir por exemplo, que comunhão na mão e tão piedoso quanto comunhão na boca, ou que o véu é mera questão de gosto, quando não esquesitice reacionária – basta chamá-los de “revoltosos” que lançam “ataques”. Jogo de linguagem, sim, mas a “comunhão” tem seus preços a pagar…

O Carona mira numa coisa e acerta noutra. De fato, é próprio da estratégia diabólica trabalhar com opostos igualmente errôneos (os revolucionários chamam de dialética e tomam isso como método de vida válido. Sim, os revolucionários pensam segundo a lógica dialética, ou seja, demoníaca). Diante de um problema real, sugerirá o demônio duas soluções falsas, ou se preferir, uma falsa solução à esquerda e uma falsa solução à direita. Em última instância, a nota para discernir se a solução é falsa ou não reside no que eu chamo de “critério do Anticristo”. Se a solução está baseada em humanismo, é falsa; se está baseada na glória de Deus e defesa da fé em sua integralidade, é provavelmente verdadeira.

De fato, diante do modernismo reinante, que atualmente obscurece a verdadeira Igreja, escondendo seus tesouros e combatendo sua Tradição, duas são as atitudes erradas. À esquerda, promover ou ser conivente com a heresia. À direita, revoltar-se contra a autoridade.

Em relação à autoridade, devemos ser dóceis sempre. Porém, não somos kantianos. Não pensamos segundo imperativos categóricos. O princípio da docilidade à autoridade existe porque é obrigação desta zelar (olha o termo de novo) pela verdade e pela retidão. Ora, se a autoridade é pela verdade e pelo bem, é insensatez revoltar-se contra ela. Contudo, quando o que está em jogo é a própria verdade e o próprio bem, a autoridade descumpre seu papel, então, neste caso, é lícito que o inferior não obedeça ao superior (Cf. Suma Teológica, II-II, q. 105, art. 5).

Mas como explicar essas nuances para quem confunde crítica com ataque e revolta?

Os tradicionalistas rezam pelo Papa. Suas adorações, muito mais sóbrias e solenes do que vemos nas paróquias diocesanas, suplicam a Deus a favor do Papa e a favor das autoridades.

Então, sim, a revolta é uma atitude errônea (é por isso que os tradicionalistas não passam pano para os sedevacantistas, senão que os desprezam). Mas também o é a condescendência e a omissão. Em termos de espiritualidade: a mornidão.

É fake news atrelar as críticas à Igreja pós-conciliar a uma atitude, em si, revoltosa. É pelos frutos que conhecereis. Os frutos dos modernismo são maus. Não dá para tapar o sol com a peneira do fingimento nem com truques linguísticos (rotulagem barata, chamar a crítica de ataque, falar de “comunhão” na paróquia num contexto de hegemonia herética, etc).


Deve ser fantástico dirigir-se ao grupo mais perseguido atualmente e, ao mesmo tempo, o mais doutrinalmente correto – os tradicionalistas – para difamá-lo chamando de ideológico e revoltado e, não obstante, crendo-se ser obediente e uma arauto da comunhão. É a receita para praticar o mal em ato, imaginando-se estar fazendo o bem. Cuidemos para não cair na tentação do “Santa” Carona.


Nominalismo nas alturas.

Ao contrário das ideias soltas do Carona, cuja forma mentis já criticamos (mas que ele, se ler, vai entender como um ataque), os católicos tradicionalistas, por sua base tomista, preferem discernir não com base em canetada ou carteiraço, nem surfar em modas doutrinais ou fazer malabarismo com costumes mundanos, mas com base na Tradição Magisterial, uma vez que a Verdade não se contradiz.

Enfim, está batendo num espantalho.


Quanta coragem! Curvar-se, na prática, ao status quo do conservadorismo católico e tornar vago problemas graves concretos no dia a dia paroquial, tudo em nome da “comunhão”, da “obediência” e, claro, implicitamente, da fraternidade #CNBB.

Novamente, não está nem no Catecismo Romano, mas no Catecismo atual (n. 675), “A perseguição (…) porá a descoberto o «mistério da iniquidade», sob a forma duma impostura religiosa, que trará aos homens uma solução aparente para os seus problemas, à custa da apostasia da verdade".

Não é uma impostura religiosa como o modernismo, que é o responsável pelas desordens na vida da Igreja (embora o Carona atribua a culpa aos tradicionalistas por uma inversão que é típica da mentalidade revolucionária), mas está mitigada nas posturas conservadoras e continuístas, onde a defesa da Tradição jamais deve cobrar o preço de descontentar o irmão ou criticar – sem revolta ou ódio, é claro – a má autoridade. Não deixa de ser um apreço por uma falsa paz à custa da apostasia da verdade.

Não se assuste o leitor. Chesterton já via essa marcha revolucionária no espírito conservador: “⁠O mundo está dividido entre conservadores e progressistas. O negócio dos progressistas é continuar cometendo erros. O negócio dos conservadores é evitar que erros sejam corrigidos“. Os católicos tradicionais têm o hábito de denunciar essa dialética hegeliana que faz avançar a Crise da Igreja. Naturalmente, isso causa raiva e unem sinistramente libertários e conservadores em ataque contra os tradicionalistas. Que coisa, não? #quico #chaves

Mas, claro, é sempre possível optar pela “obediência” e pela “comunhão”. Sendo assim, não esqueçamos! Se houver escândalo, ignore, pois, ignorando-o, não irá expor nenhuma fragilidade. Se for criticar, ainda que seja o modernismo, que seja de forma vaga; colocar as coisas em termos concretos pode ofender a sensibilidade dos sem instrução. E se for criticar os tradicionalistas, faça através de um espantalho sem nunca entrar no mérito de suas teses; para isso, chame-os de desobedientes e revoltosos, se eles têm razão ou não, é secundário, que tudo fique de forma vaga. Mais genialmente humanista que isso é impossível.

Fonte: Instituto Santo Atanásio

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2025

"Ser do lar pelos filhos, sim! Pelo marido não." O feminismo conservador ataca novamente.



A influenciadora católica Samia Marsili, esposa do médico e empresário Ítalo Marsili, publicou aqui uma polêmica opinião a respeito do trabalho feminino quando os filhos já forem crescidos e não necessitarem mais dos cuidados maternos. Samia havia recebido um desabafo de uma seguidora que reclamava das críticas que recebia por ser totalmente do lar: "Me criticam por não ir trabalhar fora para ficar em casa e exercer o meu papel de educar meu bebê.". Samia respondeu da seguinte maneira:

"Ser mãe hoje em casa não é a mesma coisa que ser mãe há muito tempo atrás. Hoje em dia, a gente tem informação, a gente tem capacidade de se formar intelectualmente, porque os nossos filhos crescem, os nossos filhos crescem, o nosso plano maternal, o nosso plano de vida não pode estar totalmente vinculado aos nossos filhos. Isso é uma questão de planejamento. A gente vai estar com eles enquanto eles são pequenos, enquanto eles precisam da gente. E as fases vão mudando. Enquanto eles são muito pequenos, a gente precisa estar mais. Depois que eles estão maiores, a gente já consegue trabalhar e fazer outras coisas. Quando eles são maiores, mais ainda, né? Então a gente não pode ficar em casa com os nossos filhos paradas no tempo. A gente precisa conseguir se profissionalizar, ler bastante, construir relações. Para que a gente consiga continuar vivendo a nossa vida depois que eles crescem. Os nossos filhos, eles têm, o quanto tempo que a gente vive na vida e quanto tempo eles são pequenos, que precisam de nós, é um curto período de tempo. E aí que está essa questão do nosso planejamento. A gente precisa se planejar para que a gente consiga estar ali naquele tempo. E o que eu estou fazendo enquanto eles estão pequenos? Que parte da minha formação profissional ou pessoal, enquanto pessoa, que habilidades de soft skills..."

Percebamos de cara que Samia não traz qualquer conforto à mãe que heroicamente cuida do seu filho e é criticada por isso, mas, de certa forma, dá eco aos críticos ao "apressar" a mãe a realinhar seu estado de vida para a "vida de verdade", isto é, a vida sem filhos.

Samia aparenta dizer que a mulher casada, uma vez livre dos filhos, pode tranquilamente dar vazão à mulher de Linkedin que existe dentro dela, isto é, à mulher carrerista e que cuida dos próprios projetos pessoais.


Samia, nesse sentido, está apenas reproduzindo uma visão bastante disseminada entre as mulheres e moças do Opus Dei. Infelizmente, predomina entre as moças da Obra um certo feminismo soft, que decorre da visão liberal corriqueiramente adotada pelo Opus Dei. Dificilmente, se verá nas formações e nos livros da Obra referências ao Magistério pré-conciliar sobre a família e muito menos ensinos sobre a hierarquia familiar e sobre os deveres específicos do homem e da mulher no matrimônio. Em regra, o roteiro geral dos livros e das formações do Opus Dei sobre a família se apresentará mais ou menos assim:

1. O governo da casa é obra comum do casal. Afirma-se isso, muitas vezes, sem sequer mencionar a inafastável chefia do marido e seu dever de sustentar mulher e filhos. Omite-se, constantemente, os deveres específicos do marido e da esposa no casamento. Assim, deixam caminho aberto para o entendimento de que esses deveres são de livre acordo entre o casal.

2. Somente há uma hierarquia na família, a dos pais para com os filhos. Omite-se o dever da esposa de submeter ao marido. Impera a ideia de "submissão mútua" sem hierarquia.

Assim, é muito comum o seguinte cenário na Obra: se aparece uma mãe de 6 filhos e que é do lar, ela é bem-vinda; porém, se aparece outra com 6 filhos, mas que prefere deixá-los com uma babá e que delega os cuidados da casa para uma empregada, a fim de progredir na carreira, ela é igualmente bem-vinda.

Todavia, uma visão liberal da vida assim não pode prosperar por muito tempo. Com o passar do tempo, as mulheres passarão a ter uma visão mais feminista da vida. E isto já se vê hoje. Em vários centros femininos da Obra é bem sabido o itinerário de muitas moças, principalmente daquelas que saem dos meios tradicionais para o Opus Dei:

(i) Na modéstia. Abandonam seus véus e vestidos e adotam o look "opus ryca", isto é, os modelos empoderados da mulher de Lindekin ou da mulher dondoca de 50 anos que usa calça pantalona; adotam uma visão liberal da modéstia dizendo "Modéstia é uma virtude, não tem a ver com roupas". Usam então, indistintamente e sem critérios objetivos, vestidos, calças, biquinis, maiôs, vestidos com decote, vestidos sem decote, blusas de alcinha, blusas com manga, vestidos com abertura lateral na perna, vestidos sem abertura lateral na perna. Enfim, modéstia não se torna mais um assunto importante. Todas são amigas, modestas ou não.

(ii) Na família. Advogam por uma visão mais freestyle do casamento. Defende-se que mulheres podem ser igualmente boas em tudo, isto é, como mães, esposas e profissionais.

No tema que importa a este artigo, convém rebater a principal premissa de Samia Marsili, a saber, que, uma vez sem filhos, a mulher casada está liberada para sair de casa e trabalhar como quiser.

O ensinamento da Igreja

Samia parece já simpatizar com o discurso de certas feministas católicas de que a mulher não trabalhar fora seria algo como "anular-se como mulher". Muitas influenciadoras conservadoras como Jéssyca Jacóbus, Olinda Scalabrin e outras adotam esse discurso. Por isso tentam encaixar o carreirismo na vida de casada. Algumas defendem o carreirismo independente da existência de filhos, outras apenas enquanto os filhos não existirem ou já forem crescidos.

No entanto, o Magistério da Igreja é claro em ensinar que a mulher casada, independente de ter filhos ou não, deve trabalhar em casa ou nas adjacências, pois os deveres específicos da mulher no matrimônio são: (1) submeter-se ao marido; (2) cuidar da casa e (3) educar os filhos. Em outras palavras, se ausente os filhos, ainda permanecem os deveres de cuidar do lar e estar à disposição do marido.

Catecismo Romano:

De boa vontade vivam dentro da casa. Não saiam senão por necessidade, e nunca se atrevam a fazê-lo, sem a permissão do marido.”

Bento XV:

“Com o declínio da religião, as mulheres cultas perderam o sentimento de vergonha e a piedade. Muitas, para assumirem ocupações inadequadas ao seu sexo, começaram a imitar os homens. Outras abandonaram os deveres de dona de casa, para os quais foram formadas, para se lançarem de forma imprudente na corrente da vida.” (Epístola Natalis Trecentesimi)

Pio XI na Quadragesimo Anno:

As mães de família devem trabalhar em casa ou nas suas adjacências, dando-se aos cuidados domésticos. É um péssimo abuso, que deve a todo o custo cessar, o de as obrigar, por causa da mesquinhez do salário paterno, a ganharem a vida fora das paredes domésticas, descurando os cuidados e deveres próprios e sobretudo a educação dos filhos. Deve pois procurar-se com todas as veras, que os pais de família recebam uma paga bastante a cobrir as despesas ordinárias da casa."

O mesmo Papa em em Casti Connubii:

"Os mesmos mestres do erro, que por escritos e por palavras ofuscam a pureza da fé e da castidade conjugal, facilmente destroem a fiel e honesta sujeição da mulher ao marido. Ainda mais audazmente, muitos deles afirmam com leviandade ser ela uma indigna escravidão de um cônjuge ao outro; visto os direitos entre os cônjuges serem iguais, para que não sejam violados pela escravidão de uma parte, defendem com arrogância certa emancipação da mulher, já alcançada ou por alcançar.

Estabelecem, mais, que esta emancipação deve ser tríplice: no governo da sociedade doméstica, na administração dos bens da família e na exclusão e supressão da prole, isto é, social, econômica e fisiológica. Fisiológica por quererem que a mulher, de acordo com sua vontade, seja ou deva ser livre dos encargos de esposa, quer conjugais, quer maternos (esta mais do que de emancipação deve apodar-se de nefanda perversidade, como já suficientemente demonstramos). Emancipação econômica por força de que a mulher, ainda que sem conhecimento e contra a vontade do marido, possa livremente ter, gerir e administrar seus negócios privados, desprezando os filhos, o marido e toda a família. Emancipação social, enfim, por se afastarem da mulher os cuidados domésticos tanto dos filhos como da família, para que, desprezados estes, possa entregar-se até às funções e negócios públicos." (n. 75) 

Assim vemos que não existe nenhum ensinamento da Igreja que afirme que a mulher, no casamento, deve perseguir seus sonhos profissionais para "não anular a si mesma", independente da vontade do marido ou da necessidade dos filhos. Na verdade, a Igreja ensina o oposto: que a mulher deve se subordinar ao bem comum da família e sacrificar seus interesses pessoais se for o caso. Perseguir um projeto profissional pessoal é um interesse particular, mas perseguir o bem da família é um bem comum, que é sempre superior. E o meio mais eficaz para o bem comum da família é que a mulher trabalhe em casa.

Certamente, a ausência de filhos propicia um tempo mais livre para a mulher, mas nem por isso se deve presumir que ela agora pode praticamente levar uma vida de solteira. Muitas mulheres pensam errôneamente que a ausência de filhos permite a delegação dos deveres domésticos e seu recomeço como mulher de carreira. Enganam-se. Como vimos, a Igreja ensina que a esposa não pode se afastar dos cuidados domésticos para empenhar-se em trabalhos externos sem necessidade.

A respeito, convém citar um trecho do luminoso livro "Ask your Husband" da escritora católica Stephanie Gordon:

"Objeção 3: E as mulheres que são casadas e ainda não têm filhos? E as mulheres cujos filhos já cresceram e saíram de casa?

Essas mulheres ainda têm um marido para servir e uma casa para manter, então a exigência de permanecer em circunstâncias comuns em casa ainda se aplica a elas. Depois que seus filhos crescidos saírem de casa, elas certamente estarão muito menos ocupadas do que quando seus filhos moravam com elas. Mas o ensinamento da Igreja ainda se aplica porque tanto a casa quanto o marido precisam da atenção cuidadosa de uma mulher. É um fruto amargo da modernidade que tantas mulheres católicas fiéis fiquem em casa apenas para cuidar de crianças pequenas, mas não dos maridos - uma motivação que presume que o serviço de um marido não é a tarefa principal da esposa. É como São Paulo escreve em 1 Coríntios 11:7, "[O homem] é a imagem e glória de Deus; mas a mulher é a glória do homem." Este proeminente ponto é muitas vezes negligenciado. Neste contexto, o conceito de glória indica o papel de ajudante, auxílio ou serva. O dever principal da esposa é ajudar o marido em casa, o que explica — quer haja ou não crianças pequenas na casa — por que, em todas as circunstâncias comuns, ela deve permanecer lá, embelezando- a e preparando- a para o retorno dele do trabalho.

Por alguma razão, alguns católicos tradicionais consideraram que ficar em casa para criar os filhos é aceitável, mas ficar em casa para servir o marido é inaceitável. Este último, eles raciocinam bizarramente, está abaixo da dignidade da mulher. Nem a Escritura nem a Tradição Católica apoiam a falsa distinção que eles fazem; tanto a Escritura quanto a Tradição deixam perfeitamente claro que as esposas devem normalmente ficar em casa pelo bem de seus maridos.

Cozinhar, limpar, intimidade, conversar, consertar, nutrir, jardinagem, fazer coisas geralmente bonitas - todos os sinais de ser o coração conjugal do lar - acontecem de modo a acomodar o marido. Mesmo que uma mulher se encontre em casa e tudo o acima seja realizado, ela deve usar seu tempo livre nas buscas de melhorar a si mesma. Muitas mulheres aprendem um novo ofício em casa ou buscam estudos domésticos."

Stephanie reproduz exatamente o ensinamento da Igreja. Mesmo sem filhos, a mulher deve continuar cuidando do seu marido e da casa. Afinal, se uma mulher defende que apenas os filhos a impediriam de ser uma carreirrista, mas nunca o marido, o que ela está dizendo, em outras palavras, é que ela não sujeita sua vida a um homem; ou seja, feminismo!

Nesse contexto, Samia parece também não levar em conta que o trabalho fora de casa, mesmo do marido, só é justificável em caso de necessidade. Afinal, o trabalho externo afeta em demasia os deveres matrimoniais dos cônjuges, pois, entre outros perigos, os esposos se separaram por um longo período do dia, os filhos convivem menos com o pai, o marido fica exposto em demasiado ao contato outras mulheres. Mas o homem cristão só se expõe a essas coisas por necessidade de sustentar a família, não por mera ambição ou desejo pessoal como pretendem Samia e outras mulheres.

O Pe. George A. Kelly em seu "Manual do Matrimônio Católico", nesse sentido, acrescenta perigos adicionais do trabalho externo à mulher:

"Quase sempre, a esposa que se emprega com um objetivo temporário (comprar uma nova mobília para a sala, por exemplo), cedo descobre que o padrão de vida da família melhorou e que esta precisa de seu salário para continuar vivendo no nível a que se acostumou. Quando as mulheres ajudam no sustento da casa, alguns (i) maridos tendem a tornar-se preguiçosos e negligentes para com seus próprios deveres. É provável também que, aproximando-se o salário da espôsa do percebido pelo marido ou mesmo excedendo-o, o orgulho dele fique profundamente ferido e surjam (ii) disputas dentro do casal para decidir quem é o cabeça do lar.

O trabalho fora de casa pode também desenvolver numa esposa traços indesejáveis. Tornando-se econômicamente independente, (iii) ela pode perder a disposição para os sacrifícios e para os ajustes emocionais indispensáveis à manutenção de relações felizes com o marido. Por outro lado, tendo contato com outros homens, surge (iv) o risco de complicações românticas. Mas não é só. Ela se depara com (v) o perigo de passar a dar excessiva importância às roupas e aos enfeites e também com o de perder sua feminilidade e tornar-se menos refinada. O pior de tudo, porém, é que, no afã de conseguir bens materiais, (vi) a esposa deixará em segundo plano a educação dos filhos. As assistentes sociais são unânimes em proclamar que a delinqüência infantil é mais acentuada entre os filhos das mulheres que mourejam fora de casa, os quais, por levarem as mães a maior parte do tempo ausentes do lar, não podem ser devidamente assistidos. (p. 111)

Os perigos do trabalho externo para a mulher não são poucos. O trabalho fora de casa:

(i) Pode favorecer o retrocesso do marido em seu dever próprio de sustentar o lar;

(ii) Pode ensejar disputas pela chefia da casa, principalmente se a mulher ganha mais;

(iii) Pode fazer a mulher perder respeito e admiração pelo marido;

(iv) Pode ocasionar complicações românticas. Sabe-se que a mulher que trabalha fora é mais abordada por homens e assim tem mais ocasião de trair. A respeito, ensina Antonio Royo Marín que o trabalho externo da mulher é um dos grandes perigos para fidelidade conjugal:

"IV. Perigos que afetam a fidelidade

1. A instabilidade da carne: fraca e frágil.

2. A leviandade: pode decair em fastio, indiferença e, conseqüentemente, em desamor.

3. A excessiva severidade: o amor legítimo é magnânimo e sabe deixar uma margem à sadia liberdade.

4. Os ciúmes: suspeição, mesquinhez, impertinência, em vez de discrição.

5. O ambiente de corrupção: divulgação de contraceptivos, de livros preju- diciais, restrição antinatural da natalidade, espetáculos obscenos, certas liberdades relações sociais...

6. A vida econômica atual: Com freqüência a mulher vive mais tempo junto de outros do que do marido (o ateliê, a oficina, a fábrica...)." (Espiritualidade dos Leigos)

Segundo pesquisas, a traição feminina aumentou 40% nas últimas décadas, o que significou uma frequência 70% maior em relação aos homens. Boa parte dessas traições se inicia no ambiente de trabalho.

 (v) Favorece o perigo da mulher efeitar-se mais para outros homens do que o marido ou, ao contrário, favorece a perda da feminilidade (muitas profissões exigem que mulheres vistam roupas masculizadas). Ambas são contrárias ao interesse do marido;

(vi) Aumenta o gosto por luxo da mulher;

(vii) Deixa a mulher reticente quanto a ter mais filhos;

(viii) Ocasiona a debilidade da saúde da a mulher que, ordinarimante, sofre mais com o trabalho externo do que homem. A depressão e a ansiedade feminina aumentaram exponencialmente nos últimos anos.

Não estamos dizendo que o trabalho externo seja impossível para a mulher casada, mas os males e perigos dele são numerosos demais para que uma mulher católica os ignore simplesmente para perseguir seus projetos pessoais.

Se observarmos os santos da Igreja, em particular as santas mulheres, constataremos uma patente hierarquia, que se apresenta da seguinte forma:

1. As virgens consagradas. São de longe as mais numerosas. Isto decorre do fato de que a virgindade consagrada é superior ao casamento;

2. As mulheres casadas. Em número muitíssimo inferior às virgens consagradas estão as santas casadas. Entre as mulheres casadas, a esmagadora maioria teve um casamento tradicional, isto é, mulheres donas de casa e com filhos numerosos. Recomendamos o livro "Santos Casados" de Ferdinand Holböck que não nos deixa mentir.

3. As viúvas. Mulheres que foram eventualmente casadas, mas que após a morte do marido dedicaram-se à vida religiosa ou ao cuidado dos pobres, como Santa Rita de Cássia e Santa Francisca Romana.

4. Mulheres casadas que trabalhavam fora. Conta-se com os dedos de uma mão. Ex: Santa Giana (que não conseguiu conciliar bem o trabalho doméstico com o trabalho externo, conforme demonstramos aqui).

O que se nota é que Deus estabelece uma clara ordem de santificação. Em primeiro lugar, as mulheres mais recompensadas foram aquelas que se consagraram totalmente a Ele. Depois destas estão aquelas que seguiram seus papéis tradicionais dentro do matrimônios. Após, temos as mulherers que devotaram totalmente suas vidas à caridade para com o próximo, esquecendo-se de si mesmas. Por fim, em pequeníssimo número, estão aquelas que de alguma forma deixaram mais espaço para seus interesses pessoais, as tais "santas trabalhadoras". Com isto vemos, claramente, que o trabalho externo não é a via ordinária que Deus quer que as mulheres casadas se santifiquem. Afinal, esta via propicia mais obstáculos para a santificação do que caminhos.

Por fim, não estamos querendo dizer com isso que a mulher casada não pode adquirir novas habilidades ou desenvolver-se pessoalmente, mas que ela deve ter em mente, antes de tudo, o bem da família. E quando falamos "família" não nos referimos apenas aos filhos, mas também ao marido, seu parceiro até a morte. Os projetos de uma mulher casada devem estar entrelaçados intrinsecamente com o bem de seu matrimônio. Ignorar isto é dar causa à infelicidade das famílias.

Recomendamos vivamente a conferência do Pe. Luiz Fernando Pasquotto sobre o bem comum e a família.




Dom Bosco caiu na folia? Derrubando mais uma lorota de Viviane Varela (O Catequista)

Mal publicamos o artigo " Acabando com o Carnaval do "O Catequista "" e a página não satisfeita já inventou mais uma lor...